Acostumado a lidar com novos talentos, o chef André Mifano, do restaurante Vito, na Vila Beatriz, diverte-se com o estilo dos aprendizes. “A primeira atitude de um estagiário de gastronomia é gravar uma cenoura no braço”, brinca ele, que é uma espécie de mentor da turma, com o corpo coberto por mais de quarenta desenhos, metade deles com motivos ligados ao universo das panelas. Há algumas décadas a tatuagem perdeu o ar marginal. Além disso, houve nos últimos tempos um rejuvenescimento da mão de obra nas cozinhas da capital. Pesquisa de VEJA SÃO PAULO no ano passado com 170 profissionais do ramo indicou que quase metade tem até 35 anos de idade. A combinação entre esses dois fatores gerou a receita que está mudando o visual de algumas cozinhas.
Quando inaugurou o Marakuthai, nos Jardins, em 2009, aos 20 anos, Renata Vanzetto foi considerada um talento precoce da gastronomia. E, se o assunto é tatuagem, ela também começou cedo. “Fiz a primeira aos 12 anos, uma estrela no pulso, que hoje detesto”, conta. As flores exibidas na foto são as mais recentes, finalizadas há três meses, e completam um grupo formado por uma faca, um bracelete e as expressões “Kitchen Soul” e “Soul Kitchen” (algo como “espírito culinário” e “cozinha de alma”). “Quero cobrir o braço inteiro”, diz ela, que já marcou uma sessão para acrescentar um garfo ao conjunto.
Cozinhar em busca da perfeição é um lema para o mestre-cuca André Mifano. A frase, traduzida para o inglês (“Cooking to perfection”) e gravada na nuca, é uma das cerca de quarenta tatuagens que ele leva no corpo. Dessas, mais da metade tem a culinária como tema. “Só percebi essa tendência quando meus braços já estavam cobertos por desenhos”, conta ele, que carrega ainda vários legumes espalhados pela pele, além de um porco mordendo uma faca (esta, no peito). “Não consigo viver sem meu trabalho, é minha paixão e por isso está tão refletida em mim.”
“Passei dias arrependida, escondendo-me em casa e no trabalho”, relembra Tatiana Szeles, sobre a época em que fez seu primeiro desenho, em 2003. Hoje em dia, o quiabo verde do braço direito tornou-se o preferido entre os três que carrega no corpo. Fã do legume, ela levou um exemplar fresquinho direto da cozinha ao estúdio para garantir que o resultado fosse fiel à natureza. “Só não vale confundir com um jiló, como já aconteceu várias vezes”, brinca Tatiana, que inaugura neste mês a filial paulistana do nova-iorquino Bistrot Bagatelle, nos Jardins.
A linha da evolução humana, que começa no Australopithecus e termina no Homo sapiens, é uma imagem manjada. Mas, para Jefferson Rueda, o fim da progressão natural não seria tão óbvio. Gravada há oito meses no antebraço esquerdo, a sua versão culmina em um chef de cozinha segurando um cutelo em uma mão e uma galinha na outra. “Trata-se de uma referência ao bom momento que atravesso na minha carreira”, diz ele, que comanda as caçarolas do badalado Attimo, na Vila Nova Conceição.
Ao lado da mulher, Helena Rizzo, o espanhol Daniel Redondo comanda a cozinha do Maní, nos Jardins, eleito o melhor restaurante contemporâneo na última edição do “Comer & Beber” de VEJA SÃO PAULO. Entre os diversos ingredientes que maneja todos os dias, um mereceu sua atenção especial. “Sempre tive vontade de tatuar uma espinha de peixe”, conta ele, que realizou o desejo há seis meses. Ocupando a parte superior das costas, a tatuagem (uma das quarenta distribuídas por seu corpo) foi produzida sem rascunhos, direto na pele.