Chega hoje às bancas a nova edição de VEJA SÃO PAULO, que traz uma reportagem sobre os novos talentos da arquitetura paulistana. São sete os escritórios apontados como os mais promissores da capital, cada um com uma trajetória e um modo diferente de encarar a cidade e a arquitetura. A seleção foi feita pela revista especializada Monolito. Aqui no blog você fica sabendo mais sobre cada um deles. E, no site da Vejinha, pode conferir uma galeria de imagens com os principais trabalhos dessa turma. Olhaí:
Tryptique
Uma brasileira, três franceses e doze anos de projetos experimentais. Carolina Bueno, Guillaume Sibaud, Olivier Raffaelli e Grégory Bousquet formam o Triptyque, um dos escritórios mais ousados do país. Toda a parte de criação da equipe acontece no Brasil, mais precisamente num charmoso sobrado na Rua Gabriel Monteiro da Silva, que se expandirá para um imóvel vizinho no ano que vem. Dos 34 funcionários, 28 estão aqui e o restante no escritório de Paris. Os sócios se conheceram na França e, quando chegaram a São Paulo, chegaram a dividir os quatro o mesmo teto, de um apartamento em Higienópolis. “São Paulo foi um choque e uma paixão”, diz Bousquet. Para eles, a cidade é uma máquina, resultado de uma civilização hiperindustrial, e tem um forte caráter apocalíptico. “Nossos pais achavam que o progresso resolveria tudo, mas estamos vendo que não é nada disso. Nosso desafio é intervir por meio da arquitetura, e São Paulo é o lugar ideal para isso”, diz Raffaelli. Assim, costumam incorporar a natureza – árvores, quedas d´água e vegetação de vários tipos — nos projetos. Sobre o nicho de mercado emergente na cidade, de pessoas que querem consumir arquitetura de qualidade, Raffaelli é enfático. “É a mesma coisa que comparar comida industrial àquela produzida por um super chef, em que cada prato tem supervisão”, afirma. Para Bousquet, muitas vezes os projetos bem elaborados custam o mesmo que os de arquitetura ruim. “Boa arquitetura não é loucura de rico”, diz.
Martin Corullon, Anna Ferrari e Gustavo Cedroni são os nomes por trás do escritório Metro, criado em 2000. Corullon começou a carreira como estagiário de Paulo Mendes da Rocha, influência que perdurou ao longo de seu trabalho. “Não se trata de um estilo, mas de um jeito de pensar. A forma é apenas a consequência”, diz. Quando Mendes da Rocha ganhou o Pritzker em 2006, o equivalente ao Oscar da arquitetura, os olhos do mundo se voltaram à produção nacional. “Pegamos um momento de visibilidade da atuação brasileira no exterior”, diz Corullon, que passou uma temporada no escritório de Norman Foster (Pritzker em 1999), em Londres. As criações do Metro privilegiam os espaços coletivos: mesmo quando criam residências, as salas costumam ser mais amplas e os quartos, reduzidos. Para ele, a arquitetura não é luxo, mas um valor, algo que traz benefícios. “Um bom projeto consome menos”, exemplifica. Corullon foi colega de colégio de Lua Nitsche, arquiteta que trabalha na sala em frente à do Metro e cuja história você conhece a seguir.
Lua, Pedro e João Nitsche convivem com arte desde que se conhecem por gente: são filhos do artista plástico Marcello Nitsche. Pedro se lembra dos vídeos que o pai fazia de algumas das atividades das crianças, em que pedia para elas explicarem por que estavam colando os papeis de determinada forma ou por que haviam escolhido aquela cor. “Continuamos debatendo, argumentando e contra-argumentando”, diz sobre o trabalho deles em conjunto no escritório (Pedro e Lua são arquitetos; João colabora como artista plástico). Para os Nitsche, o brasileiro precisa repensar sua maneira de morar. “Dependência de empregada, entrada de serviço e sala que só serve para receber visita enquanto a família se espreme num quartinho para assistir à TV não existem mais lá fora e estão perdendo o sentido aqui”, afirma Lua, que de brincadeira apelidou essa cisão de espaços de “Casa Grande & Senzala” da arquitetura. As plantas desenhadas pelos Nietsche buscam ser flexíveis, com paredes e portas reversíveis, para resistir a essas mudanças culturais. No último andar do mesmo prédio, trabalham outros dois jovens talentos da arquitetura.
Os sócios Daniel Corsi e Dani Hirano já participaram de uma dezena de concursos públicos. Os concursos servem para escolher o melhor projeto de arquitetura para obras públicas e têm prazo de criação apertado, em média de um a dois meses. “O júri e os concorrentes são imprevisíveis, a probabilidade de ganhar é a mesma em um cassino”, brinca Corsi. Ainda assim, a dupla venceu a roleta duas vezes. “Participar de concurso é o que há de mais cansativo, emocional, psicológica e fisicamente. E não há nada melhor”, afirma Corsi. Quando venceram a construção do complexo do Tribunal Regional do Trabalho em Goiânia, eles ainda não tinham 30 anos. Bateram 70 concorrentes e criaram uma área de 60 mil metros quadrados. O projeto foi dividido em duas partes, uma já pronta e outra com início das obras previsto para o ano que vem. O que está pronto é o prédio onde fica o fórum, coberto por um vidro escuro (de dia é opaco e de noite, quando as luzes de dentro se ascendem, transparente). A segunda etapa inclui outro prédio a praça entre eles. Do meio da praça brota uma cúpula, que é o topo de um plenário subterrâneo que tem perfurações que imitam as estrelas da bandeira do Brasil e a luz aparece dentro do plenário. Corsi e Hirano são formados pelo Mackenzie, assim como Juan Pablo Rosenberg, do AR Arquitetos (mais adiante). Abaixo, um pessoal da FAU-USP que afirma ter um jeito “meio Mackenzie” de trabalhar.
Em São Paulo, existe uma grande rixa entre as faculdades de arquitetura da USP e do Mackenzie. As duas estão entre as melhores do país e têm modos diferentes de encarar o ensino da profissão. Grosso modo, enquanto a FAU é mais teórica, voltada a humanas, o Mackenzie tem como ponto forte a técnica, especialmente o ensino de projetos. Embora tenham se conhecido na FAU-USP, Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Marcondes Ferraz sempre foram de executar projetos, do tipo que põe a mão na massa. “Arquitetura não é produção de arte bancada por um mecenas; 90% é ralação”, resume Gimenes. “Não queremos perder a produção autoral de vista, mas ganhar dinheiro é premissa quando se abre um escritório”, diz Forte. O trio está no 260º projeto e conta com uma equipe de 22 pessoas, a maior entre os sete novos escritórios. Gimenes trabalhou em Paris com Jean Nouvel (Pritzker em 2008). Para ele, investir em projetos diferentes (entre os realizadas pelo FGMF há casas, cabeleireiro, escritório, áreas de lazer…) é fundamental. “Não queremos ser João Gilberto”, afirma em referência ao músico famoso por repetir infinitas vezes a mesma nota até achar o tom perfeito. Sua mulher, a arquiteta Clara Reynaldo, tem traçado um caminho mais joãogilbertiano: seu projeto de maior sucesso suscita dezenas de pedidos de bis.
CR2 Arquitetura
Clara Reynaldo e Lourenço Gimenes acharam uma “casinha feia e minúscula” por 340 000 reais no Jardim Europa, mas acreditaram que, com uma boa reforma, ela poderia se transformar num lar doce lar. Assim foi concebida em 2009 a casa 4×30, nome dado em referência ao tamanho do terreno, de quatro por trinta metros. A empreitada tornou-se o maior hit do escritório de Clara, o CR2, mantido com a sócia Cecília Reichstul. Clara quase prestou medicina, mas acabou se formando em arquitetura pela UFPE, no Recife. Veio a São Paulo para trabalhar. Já Cecília saiu de São Paulo para viver Xangai, na China, onde passou dois anos e meio trabalhando e aprendeu mandarim. Da grande demanda que chega ao escritório, a maioria é de pedidos de casas compactas. “As pessoas estão vendo que morar num lugar legal não é algo inacessível”, diz Clara. Segundo elas, nas décadas anteriores, havia poucos grandes arquitetos projetando para pouquíssimos clientes. “Agora a coisa está mais pulverizada: até a padaria da esquina está mais ajeitada”, afirma Cecília. As sócias descobriram sem querer um ótimo nicho do mercado imobiliário. Abaixo, outro escritório que investe num novo filão da cidade: o de apartamentos com cara de casa.
AR Arquitetos
Juan Pablo Rosenberg havia se formado no Mackenzie e trabalhado no México e em Milão (C&T Arch) antes de tocar projetos por própria em São Paulo. Marina Acayaba (que é filha do arquiteto Marcos Acayaba) formou-se na FAU-USP e trabalhou nos escritórios Aires Mateus, em Portugal, e no Sanaa (Pritzker em 2010), no Japão. Os dois se conheceram em 2007, por amigos em comum, e no ano seguinte fundavam o AR Arquitetos. “Se tivéssemos casado com outras pessoas com certeza nossos parceiros reclamariam do quanto falamos de trabalho”, diz Marina. Desde que estão juntos, seguem o ciclo “comprar, reformar, se mudar, revender”. O primeiro dos imóveis a entrar nessa esteira foi uma casa de zelador num edifício em Higienópolis, transformada em loft. Depois, um apartamento na Avenida Paulista. Mudaram-se para a rua Melo Alves para receber o pequeno Leon, hoje com 11 meses. Antes da mudança, para variar, uma baita reforma. A obra ficou a cargo de Marina, que trabalhou ali até a véspera do parto e teve de retomar as atividades uma semana depois de Leon nascer. Com as revendas de imóveis, o casal juntou uma grana e agora, além de projetar, também incorpora. Em fevereiro começam a construir o edifício Camburiú, no Alto da Lapa, com apartamento de amplos jardins e quartos enormes, de 12 metros quadrados. Da equipe de seis arquitetos, decidiram ficar com apenas um (nem secretária têm mais). “Cansamos de apenas coordenar, queremos ser um ateliê”, diz Rosenberg.