No camarim do Teatro Renault, no bairro da República, Tiago Abravanel encontra uma breve pausa nos ensaios de Anastasia. O musical estreia em 10 de novembro e coroa um ano que, segundo o artista, foi o mais intenso da carreira.
Ator, cantor e empresário que completa 35 anos na sexta-feira (21), o neto de Silvio Santos foi um dos destaques no Big Brother Brasil 22. No último dia 11, casou-se com o produtor de TV Fernando Poli. Nos minutos em que parou para a entrevista, falou sobre política, a relação com o avô e a saúde mental após desistir do reality global.
Qual área de atuação traz mais brilho ao olhar para você? Resgatar aquilo que sempre fez parte da minha vida: nasci no teatro, ao contrário do que as pessoas imaginam. Não nasci na TV. Minha ligação com teatro é maior, sempre foi minha base. É onde me encontro como artista e pessoa. Voltar para o palco após quatro anos — o último musical que fiz foi A Pequena Sereia, em 2018 — é mágico.
Em Anastasia, você interpretará Vlad, um ex-nobre vigarista. Como foi a aproximação com o personagem? Ele é divertido, despojado, um charlatão de coração bom. É o alívio cômico da peça. A história tem uma densidade pela questão que envolve a família Romanov, na Rússia, mas o personagem me possibilita ser um pouco mais mágico que o normal.
O Teatro Renault fica em um bairro tradicional de São Paulo. Qual lugar da cidade é especial para você? Aqui, no Renault, fiz meu grande primeiro musical, Miss Saigon, há quinze anos. Voltar para cá tem muita potência. Este bairro tem algo de especial. O Teatro Imprensa, que foi administrado pela minha mãe, Cintia Abravanel, fica a duas quadras. Infelizmente, está fechado desde 2011. É triste passar pela fachada. Lembro de tudo o que aprendi de teatro ali, tenho muitas memórias.
Como define o ano de 2022? Foi o ano mais doido da minha vida. Realizar o desejo de entrar no BBB talvez tenha sido o maior desafio. Não é exatamente um trabalho, mas viver aquela visibilidade é impressionante. Participar de um musical não estava na programação, mesmo porque eu tinha um casamento para realizar (risos). Fiz a audição por vídeo, há pouco menos de um mês, e um dia depois fui aprovado. Acho que essa intensidade serve para muita coisa, para me sentir vivo, me renovar.
Como foi a experiência do casamento? Foi especial. Enquanto o casamento não chegava, Anastasia foi uma espécie de alívio, um lugar onde me desconectava desse sonho. Apesar de a tensão ser positiva, era uma tensão. Consegui equilibrar tudo. No dia da cerimônia, foi puro amor. Eu e Fernando vivemos cinco anos juntos sem o público saber do relacionamento. Só no início da pandemia fizemos o anúncio. Celebrar nossa história foi a coisa mais linda que já vivi.
Acha que o direito à união homoafetiva corre algum risco no país? Eu não penso que está sob risco porque vamos continuar lutando. Infelizmente, existem pessoas no poder — espero que não estejam mais, no futuro próximo — que se acham no direito de determinar com quem você deve passar a vida. Não acredito que podemos retroceder tanto, e espero que não façamos isso. Precisamos crescer.
Sua desistência no BBB trouxe à tona o tema da saúde mental. Acha que sua participação ampliou a discussão? Sim. É um jogo, mas um jogo com pessoas. Trabalhar o comportamento humano é a grande dificuldade. Falaram que eu era o “inimigo do entretenimento”, mas para que vou querer ver o circo pegar fogo? Penso que podemos mudar a vida das pessoas de outra maneira. Meu grande erro foi não utilizar essa filosofia lá dentro. Mas não me arrependo de nada, porque sou aquilo.
Sentiu a saúde mental afetada após a saída do programa? No começo, achei que estava tudo bem. Aí vai vindo a maré… Passa e retorna. Ainda não assisti ao programa e acho que só verei mais pra frente. Mas, sim, passei por uma crise existencial. Agora, estou indo bem em lidar com as angústias, ainda mais voltando para o palco.
Silvio Santos, seu avô, construiu um império na TV. As novas gerações são mais ligadas à internet. Como vê o futuro de empresas como o SBT? Não tem como acabarem, porque o Brasil é baseado na história da televisão. Acho que, como toda sociedade evolutiva, a TV vai precisar se adaptar de alguma forma. Não podemos perder a essência, mas não dá para fingir que o tempo parou.
Como está sua relação com Silvio? Houve algum tipo de ruptura? De jeito nenhum. Após o BBB, não consegui sentar com ele para conversar. Nosso único encontro foi quando entreguei o convite do casamento. Ele ficou feliz. Mandou um cartão lindo no dia da festa. Não pôde ir. A coisa mais importante que ouvi de meu avô foi que não importava o casamento em si, mas, sim, o que eu e o Fernando construímos como família. Aí você entende que não tem a ver com idade ou época: tem a ver com o coração. E ele tem um coração gigante.
Você costuma ser discreto quando o assunto é política. Por quê? Eu não gostava de falar de política, mas a pandemia fez eu me aproximar do tema. Não consigo conceber que o atual presidente tenha um pensamento tão retrógrado. O que ele faz pelo país é desumano. Não falo nem de política, vai além dela. Não sei se Lula é a melhor opção, porque também tivemos problemas na gestão, mas não dá para continuar com uma pessoa desumana. Tenho vergonha de dizer que Bolsonaro é presidente do Brasil (Fábio Faria, casado com sua tia Patrícia Abravanel, é ministro das Comunicações). A lição que fica é: a gente fez tudo isso acontecer, também. Se estamos aqui, eu me sinto responsável. O que deixei de observar? Não dá mais para ficar alienado e não prestar atenção (à política).
Estreou a série O Rei da TV, sobre Silvio Santos, no Star+. Vai assistir? Eu quero assistir! A história dele é muito legal. Acho demais meu avô ser homenageado em vida. É potente. Por trás do apresentador sempre existiu um homem com seis filhas, uma família grande, que abriu mão de muita coisa para viver para a televisão.
Tem projetos para 2023? Estou produzindo o musical Hairspray.
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Publicado em VEJA São Paulo de 26 de outubro de 2022, edição nº 2812