Há muito mais funções entre a bateria e o casal de mestre-sala e porta-bandeira do que pode conceber nossa vã filosofia carnavalesca. É evidente que, após alguns anos de folia (seja na avenida ou assistindo à TV), saibamos dizer de cor as mais conhecidas, aquelas que ganham muitos holofotes e purpurina: os destaques do carro abre-alas, a rainha da bateria, a ala das baianas. Mas, por acaso, você já tinha ouvido falar do cargo de “coordenadora de casais”?
É isso que faz Laura Íris Pereira da Silva, a Dona Laurinha, da Nenê de Vila Matilde. Presidente da Embaixada do Samba do Estado de São Paulo há quatro anos, ela é a responsável pela apresentação dos dois casais de mestre-sala e porta-bandeira da escola. Isso no dia do desfile oficial. Nos ensaios, a sambista da velha guarda, de 67 anos, “coordena os casais”.
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“A principal orientação é não acabar com a tradição do samba, principalmente quando se trata de mestre-sala e porta-bandeira”, explica. “A dança veio do minueto [dança em compasso de ¾ de origem francesa], temos de dar continuidade: deve ser tratada com elegância, com porte, sem vícios de dança.”
Há de se ter muito respeito também pelo “pavilhão”, a bandeira da escola no termo inutilizado por Dona Laurinha por acreditar que “isso é coisa de torcida organizada”. “O pavilhão merece muito respeito. Quem carrega tem de ter muita personalidade, muito amor, tem de se tratar como se fosse seu próprio filho. E filho a gente não empresta para ninguém, não é mesmo?”, diz.
A comparação não é por acaso. A primeira porta-bandeira da Nenê de Vila Matilde é sua filha, Rubia. No dia oficial do desfile, há oito pessoas da equipe de Dona Laurinha coordenando especialmente os dois casais. “Eu vou na frente, apresentando os casais, e eles se dividem pela avenida para dar harmonia durante toda a apresentação.”
Por falar em harmonia, há uma profissional na Mocidade Alegre responsável pela comunicação de toda a escola no “dia d”. A função de Ariane Camilla, integrante da diretoria de harmonia, é gerenciar o andamento da escola pela avenida: se um carro alegórico emperrar no começo, por exemplo, ela deve literalmente “correr pelas beiradas” para ir avisando ala a ala e diminuir a afamada cadência do samba. Isso, afinal, pode custar pontos importantes no desfile.
Sempre alerta
Um papel importante, embora seja prioritariamente de “stand by”, é o dos mecânicos de carro alegórico. Eles não integram somente uma, mas várias escolas de samba, já que descobriram um “filão” e tornaram-se especialistas. Antonio Carlos de Camargo, o Ney, de 47 anos, é um deles. Camisa Verde e Branco de coração, Ney atua há 14 anos na área, atendendo outras duas escolas: Mocidade Alegre e Vai Vai. Ele é responsável pela manutenção (geralmente, a partir de novembro) e manobra dos carros alegóricos, do barracão ao Sambódromo. “O pessoal da escola monta todo o carro alegórico e só depois pensa sobre onde é que o motorista vai ficar. É aí que eu entro”, explica.
A comunicação que deve haver entre o motorista e a diretoria de harmonia da escola, no dia do desfile, é essencialmente visual, ressalta Ney. “Já reparou que ninguém nunca enxerga os motoristas dos carros? Mas eles estão lá e é o meu dever pensar na melhor forma de posicioná-los.”
Há carros com cambão (ferro encaixado no eixo da frente do carro) e com volante, que têm eventualmente motor. A função deles não só é deixar tudo tinindo para entrar na avenida (uma vez lá, é rezar para que nada dê errado), como também manobrar os carros, de modo que eles fiquem estacionados no melhor ângulo para entrar na avenida. Ney conta que recebe por serviço. Uma manobra difícil, que exija habilidade para tirar o carro alegórico do barracão, pode render até R$ 500,00. Mas ainda não dá pra viver só disso: “A prioridade é a minha oficina mecânica, que fica na Vila Nova Cachoeirinha.”
Agora, se você notar um cargo extra à frente da bateria, além da tradicional rainha, é para ganhar pontos com a ala masculina do público: Adriana Bombom foi coroada “diva da bateria” da Nenê de Vila Matilde.