A nutricionista Bruna Marquezi, de 31 anos, ficou surpresa quando foi demitida em meio à pandemia. “Fiquei perdida. Já sentia que precisava me reinventar, mas estava sem reação”, conta. Lembrou da dica dada por uma amiga no ano passado: consultar uma astróloga para analisar seu mapa astrológico. “Achei que seria o momento de tentar.” Em uma hora e meia de conversa por videochamada, surgiram algumas inspirações. “Ela me descreveu como ninguém e discutimos juntas em quais alternativas eu poderia apostar”, afirma. Ainda em agosto, Bruna começa um curso de pós-graduação, com o objetivo de migrar para a área hospitalar da sua profissão e planeja estudar no exterior. “Fiquei aliviada porque quero cuidar das pessoas com o meu trabalho e não sabia como.” No início do isolamento, perfis como o de Bruna pipocaram com mais intensidade nos consultórios dos astrólogos, que viram suas agendas encherem, mesmo com a mudança para os atendimentos virtuais.
Foi o caso da astróloga Jacqueline Cordeiro, que ficou preocupada ao achar que veria sua clientela minguar no período, quando precisou fechar seu consultório na região da Avenida Paulista, onde atendia cerca de cinco clientes por dia, três vezes por semana. “Corri para adaptar a minha casa para transferir os atendimentos para o on-line.” O movimento, no entanto, foi o contrário. Precisou disponibilizar horários durante cinco dias na semana e faz de cinco a sete consultas diárias. “A pandemia foi um choque de realidade e todo mundo começou a olhar para dentro, revisar suas relações interpessoais e com as coisas também”, afirma. “A astrologia vem como uma ferramenta para auxiliar no autoconhecimento, como lidamos com as frustrações e como podemos evoluir”, explica.
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Segundo Titi Vidal, que atua na área há quase vinte anos, o mapa astrológico, também chamado de mapa natal, é como uma fotografia do céu no instante do nascimento da pessoa, levando em conta o momento e o local exatos do evento.“O mapa é composto de planetas, Sol, Lua, os signos e as casas, com os ângulos, ou os aspectos entre eles”, diz. “Ele se torna uma espécie de DNA, válido pela vida inteira, e vai conter as nossas características de personalidade, padrões emocionais, físicos, intelectuais, vocacionais, saúde, entre outros”, explica. Uma vez com essas informações, aliadas aos aspectos do céu no momento atual, é possível entender e desenvolver habilidades e capacidades para enfrentar situações adversas. Ela conta que, nesses últimos meses, ainda que as pessoas busquem por respostas sobre o futuro que parece incerto, as questões sobre autoconhecimento acabam surgindo por causa das explicações contidas no mapa. “Neste período também vieram as perguntas sobre o coletivo e o que a astrologia fala desta situação que vivemos”, afirma. Saúde e, claro, emprego entraram no rol de dúvidas ao lado de relacionamentos afetivos, o que era pouco comum até então.
As perguntas sobre o cenário geral também apareceram com mais frequência nos atendimentos de Andreia Modesto, assim como os pedidos de urgência para as consultas. Andreia, que é colunista do site da Vejinha e faz as previsões semanais para os signos, precisou estender ainda mais o número de atendimentos, com mais horários nos fins de semana. “Nos primeiros dois meses, os clientes vinham com muita ansiedade, com medo, e o que eu mais falava era para manter a calma”, explica. Há 33 anos se dedicando à profissão, ela conta que nunca teve uma busca tão grande pela área. “O Plano Collor, com o confisco das poupanças (1990), deixou muita gente mal e me lembro de ser bastante procurada, mas desta vez é com todo mundo, o que mostra a vulnerabilidade do ser humano.” Andreia não se impressiona com a alta demanda, já que sente que as pessoas estão mais abertas ao processo. “Muitos dos pedidos de consulta vieram de quem eu já tinha o contato, mas só agora achou que seria o momento.” A arteterapeuta Carmen Kuntz, de 62 anos, segurou o telefone de uma astróloga por três anos, depois de presentear a filha mais nova com uma consulta em seu aniversário. “Eu não me sentia preparada”, lembra. Mudou de ideia no último mês, quando veio a vontade de entender como funciona e como ela pode tirar o melhor proveito deste e dos próximos desafios. “Eu queria saber se o que eu fiz até aqui, na minha vida, estava certo. Além disso, ouvi que, pela idade, já não restava muita coisa para mim e eu me recusava a aceitar isso”, conta. Com áudios enviados pelo WhatsApp, que somados davam duas horas e meia de análises, veio o alívio: estava no caminho certo, e, sim, tinha muito a realizar ainda. “Abriu meus horizontes e foi muito interessante ver como se encaixou e como eu posso mudar de agora em diante.”
De acordo com as astrólogas, esse interesse vem crescendo, potencializado pela pandemia, o que rendeu aumento também nos pedidos de cursos básicos sobre o assunto. “Recebi muitas clientes que agora estão em casa e querem se aprofundar, não querem ser astrólogas, mas entender seu mapa ou melhorar algum aspecto específico”, conta Jacqueline. Segundo ela, “virou cool” entender de astrologia. “Há vinte anos, quando larguei meu emprego numa agência de publicidade para me dedicar ao tema e às consultas, fui encarada com desdém. Hoje, quando falo o que faço, todo mundo me enche de perguntas”, diverte-se ela, que tem notado o interesse da turma mais jovem sobre o assunto. Tatiane Lisbon, de 28 anos, é a Papisa, uma personagem que ela criou em 2015 nas redes sociais para chamar seus atendimentos. “No início da pandemia, eu tinha fechado a agenda até para entender o que eu estava passando, ficar bem comigo. Assim que voltei, ficou bem corrido, com quinze pedidos de consulta.”
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A internet e as redes sociais são, segundo as profissionais, as principais responsáveis por despertar interesse no assunto. “Os memes e até o horóscopo on-line, ainda que superficiais, são importantes divulgadores da profissão”, diz Virginia Gaia, há seis anos dedicada às consultas astrológicas. Mesmo que estejam mais populares, ela afirma que, por enquanto, atinge mais os públicos A e B. “São muitos anos de estudos e muita dedicação para cada cliente, por isso os valores das consultas podem ser considerados altos”, diz ela, que lembra que, além da análise, os astrólogos costumam apontar previsões para até um ano. “Eu passei a parcelar os preços em até seis vezes para poder ajudar mais gente”, afirma Virginia, que cobra 370 reais para as consultas on-line. A reportagem apurou atendimentos que variam de 215 a 800 reais. “Mas vale até para auxiliar as terapias”, afirma. Segundo ela, a astrologia era um recurso usado por reis, líderes e nobres há séculos, ao lado da astronomia, para previsões sobre tensões de guerra e até para assuntos diplomáticos. “Conforme os métodos científicos foram se desenvolvendo, a astrologia deixa de ser considerada ciência, porém, as descrições dos céus dos momentos continuam batendo.” Para quem ficou curioso, as astrólogas dizem que o céu do país permanece tenso em agosto e setembro, com melhora apenas no período do Natal. “Mas vale lembrar que cada pessoa tem seu mapa, com seus aspectos próprios, e com ele é possível enxergar como tirar o melhor proveito desta situação e evoluir com ela”, explica Titi.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 19 de agosto de 2020, edição nº 2700.
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