O campo de bocha de Trivero, onde a Itália quase se encontra com a Suíça, estava fechado havia décadas. Desde outubro, no entanto, os 6 800 habitantes da cidade a uma hora e meia a noroeste de Milão desfrutam outra paisagem. Em lugar da grama para rolar a bola deste que, como o futebol, é um esporte nacional, rosas brancas dividem o espaço com árvores frutíferas, lavanda, tília e alecrim. Há também lugares para sentar, mesas e uma escada que vira palco em dias de festa. No alto de um mastro, uma lua crescente de neon, cujo único objetivo é desejar todos os dias uma boa-noite à cidade, indica que não se trata de um jardim qualquer. É uma obra permanente do milanês Marcello Maloberti, um dos destaques da mais recente Bienal de Veneza — e a primeira num espaço aberto. Chamado deI baci più dolci del vino (Os beijos mais doces que o vinho), o jardim de arte é o mais novo presente dos herdeiros de Ermenegildo Zegna ao povoado onde o patriarca ergueu a marca sinônimo de elegância masculina. Foi na Trivero de 1910 que Zegna, morto em 1966 aos 74 anos, iniciou o negócio que hoje fatura cerca de 870 milhões de euros e conta com mais de 550 lojas em noventa países. Nos anos 1930, Zegna começou a reflorestar uma área de 100 quilômetros quadrados com o cultivo de 500 000 espécies de plantas. Naquele tempo, a paisagem não passava de um amontoado de montanhas áridas. A partir de 1993, por empenho dos filhos e netos, a área virou um parque, o Oásis Zegna. Primeiro caso de mecenato ambiental na Itália, o oásis é cenário para esquiar e fazer caminhadas por uma estrada de tirar o fôlego. “Nosso avô acreditava que a qualidade do produto estava diretamente ligada à beleza de um lugar e ao bem-estar dos seus habitantes”, diz Anna Zegna, presidente da Fundação Zegna, organização criada em 2000 para financiar projetos de meio ambiente, científicos e culturais. “Estendemos seu gesto à arte contemporânea, facilitando o contato dos moradores com o melhor da produção atual.”
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A obra de Maloberti integra o All’aperto, braço da fundação que há cinco anos se dedica, como revela o nome, a mudar a paisagem de Trivero — a céu aberto. A cada ano, um artista é convidado a realizar uma obra permanente aqui. Todas são idealizadas para influenciar de maneira positiva o cotidiano dos triverenses. O projeto começou com as 126 bandeiras em tons de verde e azul hasteadas no teto da fábrica da família, uma obra do francês Daniel Buren, conhecido pelas colunas bicolores Les Deux Plateaux no Palais Royal, em Paris. Buren imaginou bandeiras nas cores entre o céu e a montanha para marcar a passagem das estações ao ritmo do vento. O suíço Roman Signer inventou o Horloge, um relógio sem ponteiros que sopra um fio de vapor a cada quinze minutos, dando outra dimensão ao tempo. Há também as esculturas de pedras, pintadas com caretas pelas crianças do povoado sob a orientação de Stefano Arienti.
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As pedras assinalam os locais cobertos por uma rede de wi-fi. Nada se compara, no entanto, à comoção causada por Il cane qui ritratto appartiene a una delle famiglie di Trivero. Quest’opera è dedicata a loroe alle persone che sedendosi qui ne parleranno (O cão aqui retratado pertence a uma família de Trivero. Esta obra é dedicada às pessoas que falarão dele ao sentar-se aqui). Alberto Garutti, que expôs nas bienais de Veneza, Havana e Istambul, percebeu que na cidade sobravam vistas fascinantes sem lugar para apreciá-las. Instalou, então,doze bancos de cimento. Sobre cada um colocou estátuas de cães de Trivero. Essa foi a maneira que encontrou para falar das famílias daqui — na hora da escolha dos personagens, ele envolveu os alunos de uma das escolas. O costume de sentar-se e jogar conversa fora virou mania no pacato povoado. Até Anna Zegna, que vive em Milão e viaja a Trivero diariamente, gosta de se acomodar nos bancos e imaginar os diálogos que a obra suscita entre os cidadãos. “Será que falam dos cães? E os donos dos cães, o que dizem?”, pergunta-se Anna. Para o velho Zegna, Trivero era como uma família expandida. “Mantemos essa filosofia.”