Na campanha da coleção de inverno 2014 da marca francesa Sonia Rykiel, Gisele Bündchen modela tricôs folgados, regatões e calças molengas feito pijamas velhos como se posasse para o fotógrafo Juergen Teller ao acordar. Para reforçar a aparência “acabei de sair da cama”, a diretora de arte inglesa Katie Grand pediu que Gisele fosse clicada sem maquiagem. Apenas rímel e hidratante labial incolores entraram em cena. Até a escova que costuma avolumar os cabelos, alvo de contratos de peso para a gaúcha (estima-se 4 milhões de dólares pagos pela Pantene), foi dispensada. Grand os preferiu “lambidos”, uma das maneiras de evidenciar a sensualidade inata de Gisele. A campanha oficializou na moda um comportamento antiartifícios que começou entre um time de super estrelas. No último ano, Beyoncé, Gwyneth Paltrow e Rihanna, em poucos mas impactantes exemplos, compartilharam selfies sem maquiagem (e sem filtros). Em fevereiro, vinte celebridades, incluindo Julia Roberts e Scarlett Johansson, posaram para o ensaio anual da revista Vanity Fair de cara lavada (e sem Photoshop). A mensagem transparece: é a vez da mulher sem máscaras. “Autoconfiança é o novo sexy”, defende a maquiadora Bobbi Brown, dona de uma linha homônima.
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A tendência “cara limpa” poderia representar o pesadelo da indústria da beleza. No entanto, os fabricantes de cosméticos souberam interpretar o desejo a favor do faturamento anual. “O novo look é descomplicado, mas não livre de cuidados”, diz Eric Antoniotti, diretor de maquiagem da francesa Clarins. Exige, em outras palavras, uma gama de produtos que simulam o efeito natural. Em casos extremos, como o da publicidade de Sonia Rykiel, significa adotar o incolor nos lábios e no rímel — e até a substituição da máscara pelo curvador de cílios. No fim de 2013, a japonesa Shu Uemura lançou o S Curler (24 dólares), resultado de quinze anos de pesquisa e mais de 100 protótipos. O objetivo? Curvar a penugem milímetro a milímetro. Como regra, no entanto, o look natural evidencia os tons de pele (os nudes, ou nus) nas sombras, nos batons e nos esmaltes. É o visual defendido nas passarelas de Giorgio Armani, Isabel Marant, Balmain e Stella McCartney. Se, para os fabricantes de esmalte, a onda nua joga um balde de água fria na esperança de vender cores fortes e pôr as contas no azul (no último semestre, houve uma queda de 15% no faturamento de 1,6 bilhão de dólares), para a maquiagem significa aumentar a oferta. Na Bobbi Brown, o novo e já esgotado estojo de sombras Smokey Nude vai do areia ao marrom (65 dólares).
Além do universo dos nus, a tendência aponta para uma forma mais simples de compor o nécessaire: menos frascos, com conteúdos mais eficazes. “Com os avanços tecnológicos, temos produtos cinco em um, que se adaptam à vida da mulher que não quer nem vai passar horas na frente do espelho ”, diz Linda Cantello, maquiadora da Giorgio Armani Beauty. Vem daí o Maestro Fusion Makeup Foundation (61 euros), base comagentes anti-idade e textura ultra fina. Na Clarins, a novidade é o Instant Light Brush-On Perfector, corretivo que camufla olheiras enquanto trabalha no enrijecimento da pele (114 reais). “O objetivo é revelar sutilmente as características de cada mulher”, afirma Lloyd Simmonds, diretor de maquiagem da YSL Beauté. Ele responde pela linha Rouge Pur Couture Vernis à Lèvres Rebel Nudes, um gloss três em um (hidratante, fixador e iluminador de efeito 3D) vendido a 182 reais.
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É nas camadas mais profundas da pele que o look zero maquiagem se mostra ainda menos zero investimento. A busca pela aparência naturalmente perfeita catapultou a procura pelos chamados facialists, os novos gurus da estética. O termo em inglês define a categoria de profissionais especializados em tratamentos para o rosto. Terri Lawton, facialist de Los Angeles, mistura infusão de oxigênio com massagem craniofacial para atingir o quea medicina chinesa chama de “chi”, pontos de energia vital. Com isso, Lawton diz liberar o stress dos músculos da face, resultando em menos linhas de expressão. Entre as adeptas do tratamento (a partir de 330 dólares) está a atriz Demi Moore. No último ano, Georgia Louise viu dobrar o número de clientes vips (Emma Stone, Cameron Diaz e Linda Evangelista) no consultório de Nova York, com lista de espera de três meses. Tudo por causa do Lift & Sculpt Facial, sessão (400 dólares) de massagens e aplicação do CACI Ultra, equipamento que conduz correntes elétricas de intensidade minúscula. “Funciona como um lifting não cirúrgico com duração de até seis dias. É o que as celebridades buscam antes de um evento”, comenta Louise, que indica o NuFace Trinity Pro (325 dólares), equipamento portátil de estimulação dos músculos, para manutenção em casa.
No Brasil, onde afunção de facialist fica nas mãos de dermatologistas e esteticistas, a preferência segue pelos produtos manipulados, cada vez mais específicos. “Fórmulas customizadas são sempre mais eficientes”, diz a dermatologista Carla Vidal, de São Paulo. Ela desenvolveu uma receita de máscara feita com veneno da serpente papa-pinto (200 reais por quatro unidades), para um efeito lifting instantâneo. “Dura um dia e é indicado para quem tem uma festa ou sessão de fotos.” Dona de uma das agendas mais estreladas do segmento, há quinze anos Tracie Martyn abandonou a profissão de maquiadora de moda para desenvolver os próprios tratamentos estéticos, baseados em aconselhamento nutricional, ginástica facial e alta tecnologia. “Não existe receita de beleza mais poderosa do que uma rotina cercada de cuidados”, acredita a criadora do Resculptor, um equipamento que ajuda a regenerar a pele, firmando e elevando o contorno do rosto. “Depois de uma sessão de reescultura, há quem diga que passei duas semanas em retiro na Tailândia”, declarou a atriz Kate Winslet no site oficial de Tracie, sobre o tratamento de 425 dólares. Numa jornada de tantos privilégios, parece natural dar férias ao kit de maquiagem.