Comédia. Eis um gênero que anda falta no mercado. Boas comédias, quero dizer. Meu “garimpo” nesta semana foi ir atrás de filmes bem-humorados na Netflix para espantar o baixo-astral da pandemia. E encontrei quatro longas-metragens “escondidos” na plataforma digital, cada um em um idioma. Aliás, era essa a proposta: dar um breve panorama da comédia na Europa. Abaixo, você confere minhas escolhas da Irlanda, França, Espanha e Alemanha. Aproveite!
The Young Offenders > A parceria de Alex Murphy e Chris Walley deu tão certo que os atores estão preparando a terceira temporada da série derivada do filme. De 2016, o longa-metragem narra as desventuras dos amigos Conor e Jock pelas estradas da Irlanda e também na cidade de Cork, a cerca de três horas da capital, Dublin. Os rapazes são almas gêmeas, gostam das mesmas coisas e têm o visual quase idêntico. Diferem, contudo, no temperamento e no caráter. O inquieto Conor é um ladrãozinho de bicicletas, enquanto o obediente Jock ajuda sua mãe a vender peixes no mercado local. Mas a hora da virada está prestes a chegar quando Conor convence o parceiro a ir até uma região litorânea, onde foi despejado no mar um carregamento de cocaína. Eles acreditam que vão ficar milionários como traficantes e decidem rodar mais de 100 quilômetros — de bike! — para encontrar a droga. A jornada será pontilhada de apuros, sobretudo por ter um policial no encalço. O humor politicamente incorreto está em falta no cinema mundial e aqui volta a dar as caras numa história que satiriza as limitações intelectuais dos protagonistas losers e a turma de coadjuvantes incapazes que orbita em volta deles.
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A Volta por Cima > Ludovik Day e Jérôme Niel são youtubers e têm mais de 1 milhão de inscritos em seus canais. Juntos no cinema, os franceses demonstram boa química num clima de “bromance”, espécie de relação íntima entre amigos héteros que não envolve sexo. Parceiros inseparáveis desde a infância e sócios numa consultoria de tecnologia, eles são exemplo de superação, mas não esqueceram que sofreram bullying na infância. E é justamente isso que faz a dupla entrar de penetra numa festa dos ex-alunos do colégio. Enquanto o objetivo de Pierre-Yves (Ludovik) é a vingança, Jonathan (Niel) só quer fazer as pazes com o passado. Um mal-entendido, contudo, vai levá-los a novas amizades e acarretar uma ruptura entre os protagonistas. Na linha das comédias americanas, o filme aposta em situações clichês envolvendo a nostalgia escolar e traz surpresinhas ao longo da trama — a melhor, sem dúvida, reservada para a derradeira cena.
Toc Toc > Escrita pelo francês Laurent Baffie, a peça homônima fez grande sucesso nos palcos, inclusive em São Paulo, onde iniciou a temporada em 2018. A adaptação espanhola para o cinema foge do rótulo “teatro filmado”, sobretudo pela capacidade do diretor Vicente Villanueva em utilizar muito bem quase um único espaço. A introdução apresenta os personagens: há, entre outros, o taxista (Paco León) com mania de fazer contas, a bióloga (Alexandra Jiménez) que lava as mãos insistentemente, a viúva desmemoriada (Rossy de Palma) e, o melhor de todos, o senhor (o ótimo Oscar Martínez) que tem síndrome de Asperger, o que o leva a falar palavrões cabeludos por causa de um impulso incontrolável. Os seis pacientes, portadores de TOC, o transtorno obsessivo-compulsivo, aguardam o psiquiatra na sala de espera de um consultório. Mas ele vai demorar a chegar. A partir daí, surgem laços solidários e muitas discussões nervosas (e divertidíssimas) entre eles. Desfecho surpreendente numa comédia nada trivial.
Isi & Ossi > A alemã Isi (Lisa Vicari) vem de uma família milionária e quer o dinheiro de sua poupança para fazer um curso de gastronomia. Seus pais são radicalmente contra. A jovem, então, tem uma ideia. Ao conhecer o pobretão Ossi (Dennis Mojen), ela faz um acordo para que, em troca de grana, ele se passe por seu namorado e, assim, prejudique a imagem de seus nobres parentes. Ossi também vai lucrar com o pacto, já que, boxeador, pretende usar o dinheiro para ter uma grande chance no ringue. O filme alemão não foge à regra da doce comédia romântica, embora a língua germânica possa parecer dura aos ouvidos latinos. De início muito bem-humorado, o filme se acomoda no romantismo previsível, embora um coadjuvante faça a diferença: o avô de Ossi, que saiu da cadeia e virou rapper de letras racistas.
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