Em Terapia

Por Arnaldo Cheixas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
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Você é louco?

Uma popular anedota conta que o primeiro paciente de terapia chega atrasado para sua sessão. O terapeuta, então, lhe diz: “Sua questão é que você é uma pessoa resistente. Vamos cuidar disso.” Já o segundo paciente chega adiantado. Dessa vez o terapeuta sentencia: “Você é uma pessoa ansiosa e é disso que vamos tratar.” Finalmente, […]

Por VEJASP
Atualizado em 26 fev 2017, 23h32 - Publicado em 19 nov 2013, 19h45
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    Uma popular anedota conta que o primeiro paciente de terapia chega atrasado para sua sessão. O terapeuta, então, lhe diz: “Sua questão é que você é uma pessoa resistente. Vamos cuidar disso.” Já o segundo paciente chega adiantado. Dessa vez o terapeuta sentencia: “Você é uma pessoa ansiosa e é disso que vamos tratar.” Finalmente, o terceiro paciente chega pontualmente para a consulta. O terapeuta, objetivo, lhe diz: “Vamos logo tratar de seu padrão obsessivo”. Essa anedota nos mostra que, se não formos cautelosos, tudo vira patologia.

    Alguns anos atrás era comum que pessoas evitassem contar ser pacientes de psicoterapia ou análise. Isso era “coisa pra loucos”. Aos poucos, esse preconceito foi se diluindo. A psicoterapia, melhor entendida hoje, é espaço importante para o indivíduo se conhecer e aprender a lidar com suas angústias, o que proporciona a ampliação de seu bem-estar.

    Essa bem-vinda popularização da psicoterapia trouxe também uma realidade nova, na qual tendemos a rotular todo tipo de comportamento ou angústia. Dizemos que fulano está deprimido, estressado, psicótico e assim por diante. Não que o diagnóstico não seja bom. Ele ajuda profissionais e pacientes a entenderem melhor o que se passa no curso de cada tipo de angústia, já que é possível estabelecer condutas a partir do que é comum entre diferentes pessoas que sofrem com dificuldades comportamentais e psíquicas parecidas. Mas temos de tomar cuidado para não ficarmos “viciados” em rotular toda e qualquer angústia.

    Imagine uma pessoa que acaba de perder os pais num acidente de avião. Uma semana depois ela não tem conseguido cuidar de suas atividades cotidianas com o mesmo sucesso. Em alguns dias ela nem quer sair da cama e chora bastante. Devemos dizer que ela está deprimida? Certamente não. Ela está respondendo a uma perda significativa abrupta. É natural esse rebaixamento do humor. O que deve ser observado, nesse caso, é o tempo que dura esse quadro de luto e a preservação da integridade do indivíduo. A angústia, a tristeza, a raiva e a dor são normais e importantes para a superação da perda.

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    Também quando alguém pensa em si próprio, é importante ter cuidado com os rótulos, tanto aqueles elaborados por si quanto aqueles dados por outros. A pessoa pode passar a gostar do rótulo recebido e a lançar mão dele quando lhe for conveniente: “Eu não vou me dedicar ao curso, já que estou deprimido.”

    Já recebi vários pacientes em meu consultório que chegam com um diagnóstico de pânico, dado normalmente em um hospital que o atendeu durante um evento de grande ansiedade. A síndrome de pânico é uma patologia na qual a pessoa é recorrentemente acometida por crises de medo e ansiedade sem um motivo evidente. O paciente me relata, assim, vários “ataques de pânico”, inclusive ao longo das primeiras semanas de terapia. Mas, depois de elaborar uma boa anamnese e de conhecer melhor o histórico do paciente, percebo que a primeira crise que ele sofreu tinha um motivo, um fator desencadeante. Normalmente, há uma situação de risco de alguma perda efetiva (emprego, vínculo afetivo, saúde etc.). Compreendo, enfim, que o paciente passou por uma crise aguda de ansiedade, que é uma resposta involuntária ao stress sofrido. Quando digo ao paciente que ele não sofre de pânico, as crises desaparecem como mágica. Isso mostra que as crises que sucederam a primeira foram determinadas pelo diagnóstico equivocado que, podemos dizer, instalou na pessoa a síndrome de pânico. Interessante que, mesmo explicando não se tratar de pânico, alguns pacientes me agradecem por tê-los curado, o que não aconteceu, de fato, já que não havia aquela patologia e, mesmo que houvesse, a terapia não tem essa prerrogativa.

    Cuidado com os rótulos e com as explicações rápidas para suas angústias. Elabore-as sem pressa e busque soluções estáveis que só um acompanhamento frequente pode promover. A angústia é um componente com o qual toda pessoa lida em vários momentos de sua vida. O diagnóstico bem feito auxilia na elaboração de condutas para os casos em que sua vida estiver desestruturada e também a estabelecer as proteções necessárias para a etapa inicial de acompanhamento. Mas, para além desse olhar inicial, refletir sobre sua vida como um todo é que lhe possibilitará lidar com os desafios sucessivos impostos pelas suas angústias.

    Vai chegar no horário para sua próxima sessão?

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