Um dos eventos anuais mais esperados de São Paulo nas décadas de 70, 80 e 90 era a Feira de Utilidades Domésticas, a conhecida UD, que se realizava geralmente no mês de abril no Palácio das Exposições do Anhembi. Sua popularidade só era comparada à do Salão do Automóvel, outro evento de grande repercussão. Todo mundo diz que brasileiro é apaixonado por automóvel, daí o grande sucesso do Salão. Mas podemos também concluir que essa paixão se estende aos eletrodomésticos e às novidades tecnológicas que sempre marcavam presença na UD.
A feira era um acontecimento aguardado por todos. Grandes fabricantes de eletrodomésticos montavam estandes imensos para mostrar seus produtos ao público, sempre ávido por novidades. Lançamentos importantes eram guardados para serem divulgados na feira, que também era uma prévia de tecnologias que estariam disponíveis somente num futuro, às vezes não tão próximo.
A área de áudio e vídeo era sempre uma das favoritas do público. Produtos eletrônicos de última geração eram apresentados, alguns que se tornariam tendências com o tempo e outros que nem chegaram a ser efetivamente fabricados. A UD era a forma de a população ter contato com produtos de tecnologia fabricados no exterior, já que naquele tempo os produtos importados eram sonhos distantes para a grande maioria da população.
No início dos anos 80, um grande fabricante mostrou uma televisão que vinha com uma caneta que servia para desenhar diretamente na tela, produto que nunca chegou às nossas lojas. A televisão em estéreo foi outro produto que foi lançado na UD, e que acabou se tornando muito popular nos anos seguintes.
Veja o comercial da TV Philips Trendset Stereo, lançada na UD:
Mas o lançamento mais espetacular da história da UD foi o do CD, em 1983. Naquela época, o disquinho prateado era uma completa novidade para o público acostumado a ouvir música em seus LPs de vinil ou fitas K7. A Philips montou um grande estande para mostrar a novidade, e em um dos ambientes havia um enorme toca discos com diversos espelhos colados em ângulos diferentes. Conforme o disco rodava, um raio laser era apontado para os espelhos, que refletiam a luz em diversas posições. Foi a maneira didática que a Philips e
ncontrou para explicar para a população o princípio de funcionamento do toca discos a laser. Mas “laser”, para a maioria das pessoas era sinônimo de perigo, então sempre tinha um desavisado que perguntava “mas esse laser não pode matar alguém?”.
Nesse mesmo evento, ainda sobre o lançamento do CD, foi montado um canhão de laser de alta potência no alto de um prédio na Avenida Paulista e outro no topo do prédio que hoje é o Hotel Holiday Inn, no Anhembi, que na época era só um esqueleto de prédio inacabado. Os canhões foram apontados um em direção ao outro, e ficavam “trocando tiros” durante a realização da UD. Era realmente um espetáculo sensacional.
Mas o que mais fazia sucesso na UD era a área de varejo. Praticamente todos os estandes de produtos comestíveis tinham degustação, e as pessoas passavam horas numa fila para experimentar um novo sabor de miojo ou um iogurte com uma nova consistência. E ninguém se importava, tudo era uma festa. Produtos para a cozinha que ajudavam a fazer pratos diferenciados só eram encontrados na UD, como acessórios para cortar os legumes em formatos diferentes ou fazer ovos cozidos quadrados. Todos esses pequenos apetrechos que se encontram hoje em dia em lojas de variedades eram exclusividade da feira do Anhembi naqueles tempos.
A UD durou até o início dos anos 2000. Hoje em dia, com a globalização e a popularização da internet, não teria mais sentido ter uma feira desse porte para mostrar lançamentos, pois as novidades tecnológicas acontecem todo dia. Mas quem teve a oportunidade de visitar uma UD sabe o quanto era legal ficar horas e horas rodando por lá, cheio de sacolas de compras ou brindes, enfrentando filas quilométricas, mas sempre com um sorriso nos lábios.