EVITAR ARMADILHAS
A felicidade está na base de todas as nossas escolhas. Casamos, descasamos, compramos um carro, fazemos tudo em busca da felicidade, mas sem pensar muito sobre essas coisas no cotidiano. Por isso caímos em várias armadilhas. Uma delas é acreditar que o conceito de ser feliz seja diferente de passar por dores. As pessoas vivenciam experiências doloridas.
DECISÃO FAMILIAR
Temos uma geração que não sabe o que é dor, pois a família acredita que fará os filhos mais felizes privando-os dos “nãos”. As dificuldades trazem consciência do prazer, a escassez pode fazer perceber a bonança. Pessoas que passam por um infarto sem sequelas na maioria das vezes apresentam melhoras na satisfação com a vida. Ao compreender que a vida é finita, tiraram a lupa dos problemas que pareciam grandes. As crianças talvez reclamassem antes de ir para a escola. Pergunte agora se elas não gostariam de voltar para as aulas. Seria só alegria!
FATOR DE IMPACTO
Temos mais conforto disponível hoje do que nossos pais e avós, mas a satisfação dos desejos não tem se traduzido em felicidade e qualidade de vida. Pelo contrário, os índices de depressão só crescem. Por quê? A satisfação tem mais a ver com como se lida com os eventos do que com os eventos em si.
OS DOIS LADOS DA ADAPTAÇÃO
Existe o fenômeno da psicoadaptação da mente humana, uma espécie de incapacidade de sentir a mesma emoção ou dor diante de um evento repetido. É o que nos ajuda a superar perdas e a dar o próximo passo depois de uma frustração, por exemplo, mas é também o que nos faz deixar de desfrutar das coisas boas que já temos. Precisamos treinar o olhar.
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GESTÃO EMOCIONAL
Só querer um corpo saudável e conhecer quais alimentos fazem bem não é suficiente, é preciso alimentar-se dessa forma. Com a felicidade é igual. Não basta o desejo, é preciso um treinamento. O primeiro passo pode ser resgatar a memória do que é importante para você que, se perdesse, impactaria a sua felicidade. Andar simplesmente nos traz prazer. Aproveitar essa sensação é uma questão de gestão emocional, de passar pelo nosso sistema consciente, não só instintivo.
ESCOLHA INTELIGENTE
Precisamos trazer doses de raciocínio para construir a felicidade em cima do que é simples, do que hoje já pode até ser rotina. A felicidade tem de ser algo inteligente. competências socioemocionais como a resiliência e o olhar contemplativo podem ser desenvolvidas. Autoconhecimento é um caminho da felicidade inteligente.
FELICIDADE SE APRENDE
O momento atual abriu possibilidades para entendermos que não basta matemática, história e geografia, é preciso ensinar outras competências. Como ter relações de amizade saudáveis? Como conversar? Sempre consideramos o sucesso como o caminho para felicidade, mas na verdade a felicidade é o caminho para o sucesso.
QUESTÃO DE FAMÍLIA
A comparação interfere diretamente no nosso bem-estar. Nossos avós falavam que a grama do vizinho é sempre mais verde, mas tinham o jardim do vizinho da direita e da esquerda, no máximo. Hoje, há milhões de gramas mais verdes nas redes sociais. Quanto mais cedo a gente ensinar que o foco não está no que precisamos ter, mas na consciência do que já temos, melhor. Por isso acredito tanto em trabalhar com as famílias, que podem ensinar essa inteligência.
PERFEIÇÃO NÃO É BOA PARA NINGUÉM
Diante de angústias e situações estressantes, importa como nos posicionamos. Meus filhos não são perfeitos, nem têm de ter uma mãe perfeita. A perfeição não é boa para ninguém, principalmente na educação. Na minha família tenho um objetivo: fazê-los forte emocionalmente. E isso é ensinado por meio do exemplo. Eles me observam lidando com o inesperado, ou com algum problema, e podem construir seu repertório. Se nós formos mais inteligentes, com certeza seremos mais felizes.
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Camila Cury, psicóloga, mãe de Augusto e de Alice, é autora do livro A Beleza Está nos Olhos de Quem Vê (editora Sextante, 2010). É presidente e fundadora da escola da inteligência, maior programa de educação socioemocional do Brasil, aplicado em mais de 1200 escolas.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703.