Desde pequena tenho o impulso de observar o mundo com curiosidade. Até hoje me fascina olhar e buscar compreender o que me cerca por meio de uma visão mais ampliada do que a que os meus olhos e a mente podem me trazer.
Naquela época já olhava para a maneira com que as pessoas estabeleciam suas relações com tempo, dinheiro, amor, trabalho, felicidade, e pensava: “tem alguma coisa errada aqui! Por que todo mundo está sempre em busca e ninguém encontra nada?”. As pessoas se desencontram, a felicidade nunca fica, o amor nunca é suficiente, o dinheiro nunca chega ou nunca é o bastante. eu me perguntava: “Onde foi que nos perdemos?”.
Com a maturidade, aprendi que não é a resposta a essa pergunta que buscava, mas a pergunta certa: “Onde foi que nos perdemos de nós mesmos? A natureza do meu desejo vem de dentro ou de fora?”. Arquivada na grande memória universal da existência humana mora uma ideia poderosa e insana ao mesmo tempo, a qual acredito ser responsável por grande parte do descompasso da humanidade. A ideia de que somos melhores, mais potentes e mais dignos de pertencimento, respeito e amor quando estamos ativos, na ação, produtivos, com a nossa energia voltada para a construção do mundo externo.
Produzir, trabalhar, reagir, conquistar, aprender, construir passou a ser o combustível da existência humana, de modo que a mente se volta para a interpretação e a construção do mundo externo, criando muros, paredes, portas e janelas que são os filtros do nosso saber. Os pontos de vista, sonhos, opiniões, projeções e desejos se tornam as lentes através das quais interpretamos o mundo, ao mesmo tempo que são o combustível dos nossos desejos e ações.
O que nunca paramos para perceber é que esse filtro nos oferece um retrato muito fragmentado de realidade, um pedaço muito pessoal, individual, subjetivo, ilusório e completamente intransferível de realidade. dessa forma, se toda a nossa ação é baseada nesse retrato limitado de realidade, obviamente falharemos em encontrar o que a nossa alma realmente deseja e precisa, pois ela tem a sua essência fundamentada na totalidade.
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A não ação é um espaço que criamos internamente e que nos possibilita finalmente fechar os olhos do corpo e entrar na morada da alma, onde as portas e janelas estão escancaradas. Quando o vento da vida sopra e as janelas e portas da mente estão escancaradas, a crítica não fica, a tristeza não perdura e a escassez não se sustenta. desse jeito, o amor não encontra resistência para entrar, nem a abundância e a felicidade. tudo flui em perfeita harmonia. Vem e vai sem resistência ou apego.
É na pausa que se integra o momento presente, que se reconhece e agradece as grandes conquistas e os pequenos detalhes da vida, assim como se acolhe as lágrimas e a ansiedade, tornando possível, pela primeira vez, se conectar com a totalidade da vida sem medo. É preciso pausar para saborear e degustar a vida em sua totalidade.
A não ação é um chamado para o bem viver, pausar, meditar, sair da rotina, acalmar o fluxo de pensamentos, validando o momento presente com gratidão pelo seu processo. esse é um movimento de fé, entrega e sabedoria interior para aqueles que descobriram que o universo só diz sim, portanto, mais importante do que saber o que você tem de pedir, é preciso ter consciência do caminho por meio do qual as coisas verdadeiramente importantes chegam até você.
Se estiver à espera de um milagre e adoraria ser surpreendido pelo universo, ponha intenção na “não ação”, mergulhando nesse espaço em que você deixa de pedir e buscar. O segredo de pedir é esquecer por que precisa pedir. É quando as portas para o invisível começam a se abrir, deixando a energia da vida fluir até você.
Mentora de desenvolvimento humano, expansão da consciência e espiritualidade, Mariana Nahas (@mariananahas_) traduz conceitos filosóficos, científicos e espirituais para que sejam implementados no cotidiano.
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Publicado em VEJA São Paulo de 07 de abril de 2021, edição nº 2732