“Há muitos tipos de curadores. Alguns se aproximam de parte da produção de um artista e visitam uma, duas exposições da qual você participa. Mas o Cauê não é assim. Ele teve um olhar constante, acompanhou meu trabalho ao longo do tempo. Isso é algo que admiro, porque nós, artistas, temos evoluções, mas também fraquezas e quedas”, explica o paulistano Nino Cais, de 52 anos, em uma espécie de prefácio lisonjeiro sobre o personagem retratado nesta reportagem, o também paulistano Cauê Alves, de 44 anos. O curador revela-se um pouco Ganesha, deus indiano com quatro longos braços e todos muito obreiros. Além de estar à frente da direção artística do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), é professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pai de Luna, 8 anos, e Mira, 10, e marido da artista Lia Chaia.
Seu tom gentil costumeiro pode dar a impressão de que ele vive em marés calmas, mas não funciona bem assim. No momento, por exemplo, aproxima-se dele uma pequena maratona. Na sexta (23), ocorre a estreia do museu no braço educativo do famoso game Minecraft (imagens no final), uma espécie de Lego digital, disponibilizado para uso em escolas. “Vai ser possível visitar os espaços internos e externos. E também o Jardim de Esculturas, que fica ao redor do prédio da instituição”, explica Vera Cabral, diretora de educação da Microsoft, que toca no gigante de tecnologia o desenvolvimento desse projeto. Uma das atividades disponíveis tem como protagonista a obra Aranha (1981), de Emanoel Araújo. Pelo menos neste momento, a peça não poderá ser desmontada, como ocorre na versão comercial do jogo, em que as figuras podem ter sua estrutura dividida e recombinada. “O convite, agora, é para que os estudantes construam, com os blocos, outros ‘amigos-insetos’ para ela. É uma forma lúdica de pensar diferentes conhecimentos”, diz Vera.
Na terça (27), Alves volta sua atenção para a retomada de visitas presenciais no MAM, fechado desde 6 de março. As portas reabrem com a ida da capital para uma fase menos restritiva da quarentena, anunciada pelo governo estadual no dia 16. “Será uma abertura sem muito alarde, as pessoas terão de agendar a ida às exposições por meio do nosso site”, detalha ele.
Quando Alves ocupou o cargo de curador-chefe do MAM, em julho de 2020, o clima era tenso. “Dei um azar grande, assumi no meio da pandemia”, conta ele, que viu, naquele momento, cortes de funcionários. Passado o baque, selecionou 24 obras do acervo. Graças a uma parceria não remunerada com a agência de publicidade África, as imagens dos trabalhos ganharam totens, presentes em 170 pontos de ônibus, e ainda foram projetadas em prédios. “Com o que tenho à mão, faço o bolo crescer”, define sobre sua postura no trabalho. Resiliência parecida também foi vista em seu emprego anterior, como curador-geral do Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia (MuBE), entre abril de 2016 e julho de 2020. “Eu fazia de tudo, até assessoria de imprensa”, relembra. Findada a missão, contabiliza frutos do reconhecimento.
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“O Cauê foi peça-chave na revitalização da instituição, que não tinha um calendário consistente de exposições”, elogia Flávia Velloso, diretora-presidente do MuBE. Uma das mostras organizadas por ele sobre o paisagista Roberto Burle Marx (1909- 1994) recebeu o prêmio de melhor curadoria em 2020 pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA). É outra láurea no currículo dele, que inclui a participação em 2015 na equipe curatorial do pavilhão brasileiro na Bienal de Veneza, coordenada pelo carioca Luiz Camillo Osório.
Seus pais, já falecidos, também foram fundamentais para ajudá-lo na sua formação como curador. O pai, Rudy Alves, era diretor de arte, trabalhou na Editora Abril, que publica VEJA SÃO PAULO, e o levava para visitar exposições. A mãe, Margarida Loloian Alves, pedagoga e socióloga, tinha uma escola e aproximou o filho do mundo do ensino. Deu resultado. Alves conjuga a influência dos dois na sua visão de mundo: “Às vezes, a arte é puxada para um lugar mais vazio, de glamour, mas é obrigação do curador lembrar do papel de transformação social que ela e os museus podem ter”.
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MAM no Minecraft
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Publicado em VEJA São Paulo de 28 de abril de 2021, edição nº 2735