Todos artistas integrantes do cenário contemporâneo paulistano, Eduardo Ver, Pegge, Igi Lola Ayedun, Enivo e Bruno Novelli têm, em comum, pesquisas com desdobramentos pouco previsíveis. Eles surpreendem o público tanto nas questões tratadas e linguagens escolhidas quanto nos suportes eleitos.
As diferenças entre eles — sim, é importante falar delas — aparecem nas posturas que cada um tem diante de sua produção. Entre as abordagens há caminhos de autoconhecimento, descontração, ligação com a espiritualidade e a família.
EDUARDO VER
O xilogravurista mantém dois ateliês, um no distrito de Guaianases e o outro no bairro de Artur Alvim, ambos na Zona Leste de são paulo. “Conheci a umbanda em 2003. Desde então tenho colocado nos desenhos o que aprendo no terreiro”, afirma Ver, autor de Obaluaiê, O Velho Omolu (abaixo; 2018). Ele se apaixonou pela gravura em madeira ao visitar na pinacoteca, em 2004, uma mostra do pernambucano Samico, morto em 2013. sobre o tipo de madeira que utiliza, o artista explica: “prefiro as mais duras, como o cedro e o roxinho. Consigo fazer detalhes, e elas também não lascam”.
IGI LOLA AYEDUN
As tranças azuis da artista, de 29 anos, dão pistas sobre sua biografia. “Nasci com uma série de complicações. Minha mãe, que é do candomblé, me levou ainda bebê para fazer a iniciação. No ritual, eles usaram o wáji, que é um pó azul”, relembra Igi Lola. “Quando cresci, esqueci disso, mas foi o azul a primeira cor que conheci”, acrescenta ela, que nasceu no Brás. Antes de investigar as nuances da memória do matiz, Igi Lola já as utilizava em telas, como em Transição (abaixo; 2019), feita com acrílico, guache e pigmento índigo. se a escolha foi coincidência ou intuição, é inútil dizer. Melhor é observar também as formas, que remetem a rochas na composição.
PEGGE
As sílabas iniciais de Pedro Geraldo de Souza, de 22 anos, deram origem ao seu apelido na escola e mais tarde à sua persona artística. Essa referência ao entorno afetivo é também uma das marcas do trabalho de Pegge. Na tela Ascensão (abaixo; 2019), pinta o amigo Pablo. “Ele é co- mo uma rosa que floresce na quebrada, entrou na faculdade e toca seu trampo como produtor musical”, explica o paulistano, que, em 2019, voltou a produzir em seu ateliê na casa da mãe, em Ermelino Matarazzo, na Zona Leste da capital. “Se antes pintava meus amigos e familiares, agora eles são como canais para eu acessar outros personagens”, acrescenta.
ENIVO
“Mesmo tendo feito muita coisa na rua, eu tinha um pensamento acadêmico. Reto- mar o uso do spray, agora na tela, é uma forma de me aceitar”, explica Enivo, artista nasci- do no Grajaú e que não foge à experimentação. Nos muros da cidade, ele é conhecido pelo personagem Nikimba, com o rosto delineado por um contorno esfumaçado. No ateliê, por muito tempo produziu obras com personagens longilíneos, com o queixo protuberante. Em É Nóis (abaixo; 2019), no entanto, o protagonista é o cantor Edgar, em uma cena que remete a uma foto de Alberto Rocha em cenário de Juliana Grott. O uso do pastel dá outra textura ao trabalho, que abraça o ruído.
BRUNO NOVELLI
Geometria e espécies vegetais se encontram em Pedra Aflora (abaixo; 2014), tela do artista Bruno Novelli, que tem nas cores tropicais um dos pilares de sua produção. Outra característica é uma certa despretensão. O peso da tradição da pintura ganha assim toques de ironia e irreverência. As camadas que emergem por meio de ranhuras quebram, por sua vez, a verossimilhança. Nessas brechas, escorre então sua psicodelia. “No processo de produção, eu me valho de camadas, o que cria certo sentido de mascaramento”, detalha o artista, de 40 anos, que nasceu em Fortaleza (CE), foi criado em Porto Alegre (RS) e hoje vive na cidade de São Paulo.