Entre os critérios para avaliar o potencial de bilheteria de um filme, o melhor de todos, sem dúvida, é a expectativa criada em torno de seu lançamento. Espontânea ou estimulada, a ansiosa espera se transforma em uma força irresistível, capaz de arrastar multidões às salas de cinema logo nos primeiros dias. Comum em arrasa-quarteirões como os episódios da saga Harry Potter ou no megassucesso Avatar, tal vibração é um fenômeno raro quando se trata de produções brasileiras. Tropa de Elite 2, cuja estreia oficial está prevista para o dia 8 de outubro, foge a essa regra. Devido ao grande sucesso da primeira fita, que arrebatou o Leão de Ouro em Berlim e arrecadou mais de 30 milhões de reais, poucos lançamentos têm sido tão aguardados quanto as novas aventuras do policial interpretado mais uma vez por Wagner Moura, o capitão Nascimento. Assim como a história original foi inovadora ao mostrar a guerra da polícia carioca contra o poder dos traficantes e a complacência de uma parte da elite da cidade com as drogas, sua sequência promete retratar as raízes mais profundas dessa chaga: a conivência política. Tudo isso em meio a cenas de ação eletrizantes, com efeitos visuais caprichados.
Embora seja consequência natural do bom desempenho anterior, muito do frisson é provocado pela estratégia meticulosa do diretor José Padilha. Há três anos, ele foi obrigado a lançar o longa-metragem às pressas, depois que bancas de camelô de todo o país foram inundadas por DVDs piratas com sua versão integral. Nessa continuação, redobraram-se os cuidados para evitar vazamentos. As filmagens, mesmo as de locações, permaneceram cercadas de mistério. Atores que falavam demais em entrevistas eram repreendidos. Na fase de montagem, proibiu-se terminantemente que o local onde funcionava a ilha de edição ficasse aberto sem um responsável por perto. Para completar, o longa não será exibido em sessões privadas para a imprensa e a única pré-estreia confirmada até agora acontece em Paulínia, no interior paulista, em 5 de outubro, três dias antes do lançamento. Mas por que tanto sigilo? Em busca da resposta, VEJA RIO ouviu nos últimos três meses trinta pessoas envolvidas na produção. O objetivo era revelar algumas histórias e segredos de Tropa de Elite 2 (sem estragar a surpresa, evidentemente). O resultado dessa investigação pode ser conferido abaixo.
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1
Luiz Fernando Carvalho/divulgação
1 700 reais em multas
Todos os carros usados nas filmagens foram comprados pela produção, entre eles uma Blazer branca, placa LCS 2936, que virou camburão nas gravações. Usado pelas forças policiais na ficção, o veículo possuía um histórico de irregularidades na vida real. Nos oito meses que antecederam a compra, o automóvel acumulou dezoito infrações por excesso de velocidade, o que totalizou 1 700 reais em multas. De acordo com o site do Detran, as multas ainda não foram pagas.
2
Rafael Andrade/Folhapress
Lições de cavalo de pau
Em um dos momentos mais eletrizantes de Tropa de Elite 2, o coronel Nascimento (Wagner Moura) é vítima de uma emboscada. Fechado por dois carros, o personagem escapa com um espetacular cavalo de pau. O ator não usou dublê, mas precisou de três tentativas para conseguir executar a manobra. Antes de a cena ser gravada, um intenso treinamento foi realizado no Autódromo de Jacarepaguá com o americano Keith Woulard, que trabalhou em produções como Hulk e Homem de Ferro. Rodada em duas madrugadas, em Niterói, a cena exigia uma iluminação forte. Por causa disso, foi necessária a troca das lâmpadas de vinte postes, além do auxílio extra de um refletor instalado a 30 metros de altura.
3
Divulgação
Máquina mortífera do samba
Mais do que o talento para interpretação, o que contou mesmo na hora do convite para que o sambista Dudu Nobre atuasse no filme foi sua coleção particular de armas. Fanático por fuzis e pistolas (que mantém em casa com autorização do Exército), ele alugou à produção várias peças para serem usadas nas gravações. Na ficção, ele realiza um antigo sonho: ser policial. Nas cenas de invasão à favela, Nobre faz o papel de um Ponta 2, que, na formação do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope), significa uma espécie de franco-atirador. Graças ao seu desempenho, o dublê de ator ganhou do diretor Padilha o apelido de Máquina Mortífera do Samba.
4
TV Globo/Alex Carvalho
Desmaio na gravação
No filme, o coronel Nascimento e seu filho Rafael, papel do jovem Pedro Van Held, brigam durante a maior parte do tempo. A tensão familiar, que na primeira fita era concentrada nos desentendimentos com a mulher, agora é transferida para essa relação. Os únicos momentos de paz entre os dois acontecem no tatame, quando seus personagens treinam jiu-jítsu. Para fazer as cenas de luta, ambos foram orientados pelo especialista Rickson Gracie, um dos maiores nomes do esporte no mundo. A consultoria profissional, porém, não impediu um incidente nas gravações. Em um dos treinamentos, Van Held, já cansado, levou um golpe de Moura e simplesmente desmaiou. Felizmente, nada grave aconteceu.
Merchandising de fuzil
Enquanto outros lançamentos cinematográficos fazem merchandising de produtos de consumo, Tropa de Elite 2 promove… armas. Em meio a fuzis de calibres variados, o filme foi utilizado pela fabricante fluminense Imbel para lançar um novo modelo, o IA-2. Com capacidade para disparar 950 tiros por minuto, a arma acaba de ser lançada e tem boas chances de ser adquirida pelo Exército brasileiro. Sites especializados falam numa encomenda de 180 000 unidades.
6
Assassinato de um policial
Como acontece em Tropa de Elite, o segundo filme terá uma cena de enterro. A gravação aconteceu no Cemitério Jardim da Saudade, em Paciência, subúrbio da cidade. Na primeira parte, o morto era o soldado Neto, papel do ator Caio Junqueira. Na segunda, o elenco se espremerá entre túmulos para homenagear um dos principais personagens da trama, que também é assassinado por bandidos. Detalhe: o cadáver é de um policial que trabalhou na fita anterior.
7
Só faltou o 3D
Para criar os efeitos especiais, de um realismo impressionante, foram convocados profissionais treinados em Hollywood. Um deles é Rene Diamante, que trabalhou no megassucesso Avatar, de James Cameron. Uma das cenas que deram mais trabalho à equipe foi a de um ônibus sendo incendiado.
8
Mensagem nada sutil
Usado como locação, o prédio da Assembleia Legislativa parou por quatro dias para as filmagens. Ao todo, trabalharam lá 450 pessoas, sendo 300 delas figurantes. O camarim onde os atores se trocavam e eram maquiados foi montado na sala conhecida como “Furna da Onça”, uma antessala do plenário usada desde 1926 para a costura de acordos políticos. Nas filmagens realizadas ali, porém, o coronel Nascimento não é nada diplomático: faz um duro discurso a respeito da desonestidade dos parlamentares.
9
Fotos: Divulgação
O secretario disse não
Para dar mais realismo ao filme, um dos planos do diretor Padilha era filmar algumas cenas no gabinete do secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, junto ao prédio da Central do Brasil. O pedido foi negado. Assim, o diretor teve de se contentar em tirar fotos e reproduzir o ambiente em estúdio — o que a equipe fez com bastante competência. O mesmo aconteceu com uma sala do setor de inteligência da Secretaria, usada no gerenciamento de crises.
10
Capitã e atriz
Uma das cenas marcantes é a invasão do Morro Dona Marta, comandada pelo capitão Matias, personagem de André Ramiro. Só nessa filmagem, que chegou a provocar medo em alguns moradores, foram utilizados 100 figurantes, três camburões, um tanque e dois helicópteros. A capitã Pricilla Azevedo, comandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) na favela, faz uma ponta.
11
Mil tiros em sete quilômetros
Registrada sob um calor de mais de 40 graus, em janeiro, a ocupação do Dona Marta levou figurantes e técnicos à exaustão. Em certa tomada, um dos atores disparava oitenta tiros numa corrida de 500 metros. A cena foi repetida catorze vezes, o que significou um total de mais de 1 000 tiros.
12
“Aspira 02, pede pra sair!”
Por causa de uma entrevista em que revelava alguns diálogos do filme, o ator Milhem Cortaz, que interpreta o capitão Fábio, foi duramente repreendido pelo diretor José Padilha. De certa forma, a vida imitou a arte. No primeiro filme, Cortaz era o aspirante 02, que, perseguido pela fúria do capitão Nascimento, acabou popularizando o bordão: “02, pede pra sair!”
13
Delson Silva/AgNews
Igualzinho ao Vietnã
Nas tomadas aéreas de invasão às favelas, foi utilizado um helicóptero Huey-II, pertencente à Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil (Core). Comprado há dois anos por 8 milhões de reais, o aparelho é uma versão moderna de um modelo utilizado pelo Exército americano na Guerra do Vietnã, o UH-1H. De dentro da aeronave, o capitão Nascimento orienta os policiais em combate.
14
Tiago Santana
Execução sumária
Em uma das filmagens, moradores da favela de Rio das Pedras reviveram os tempos de domínio do poder paralelo. Um motorista de van é arrancado do veículo à força por faltar com o pagamento aos milicianos. Depois, é brutalmente assassinado. A sequência promete ser tão impactante quanto a da execução de dois personagens queimados ainda vivos no primeiro filme da série.
15
Aventura no mar
Além das cenas aéreas e de perseguição nas favelas, uma passagem com participação do ator Milhem Cortaz foi filmada no mar, na Baía de Guanabara. A equipe saiu do Iate Clube do Rio de Janeiro, em Botafogo, a bordo de uma pequena lancha pela manhã e só retornou no fim do dia.
16
fotos: Divulgação
Presídio cenográfico
Sem poder usar algumas locações reais, a produção foi obrigada a filmar tomadas em cenários construídos. Um deles representa o Complexo Penitenciário de Bangu, onde acontece uma rebelião. Realizada em um estúdio de 500 metros quadrados, em Jacarepaguá, a sequência exigiu o mesmo esmero encontrado nas cidades cenográficas das novelas da TV Globo. Para erguer o presídio de mentira foram necessários 275 000 metros quadrados de compensado, 9 toneladas de ferro, 700 quilos de pregos e 15 toneladas de cimento.
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Com um olho em Hollywood
Os realizadores têm planos ambiciosos em relação ao Oscar, o maior prêmio da indústria cinematográfica internacional. Pretendem inscrever o longa-metragem em categorias de prestígio, como fotografia, direção, roteiro e edição. O exemplo a ser seguido é Cidade de Deus, um dos casos mais bem-sucedidos de divulgação no exterior, indicado a quatro estatuetas.
18
Blockbuster nacional
Com previsão para estrear em 600 salas do país, o filme já nasce com um recorde: é o maior lançamento de uma produção nacional, em escala equivalente à do americano Homem-Aranha. A expectativa é que atinja a marca de 1 milhão de espectadores já na primeira semana de exibição. Se alcançar esse público, a fita imediatamente paga o investimento de quase 15 milhões de reais.
19
Efeito cascata
O lançamento de Tropa de Elite 2 alterou a data de algumas das principais estreias nacionais do ano. O filme Suprema Felicidade, de Arnaldo Jabor, e Muita Calma Nessa Hora, de Felipe Joffily, com roteiro de Bruno Mazzeo, foram adiados para evitar a concorrência direta nas salas de cinema. Vips, também protagonizado por Wagner Moura, foi empurrado para o fim do ano, numa forma de aproveitar a popularidade do ator.
20
Cinema de resultados
Do orçamento do filme, metade veio da iniciativa privada, sem nenhum tipo de incentivo fiscal. Trata-se de uma prática pouco comum no cinema nacional, que, em geral, se beneficia de verbas públicas. No caso de Tropa de Elite 2, os investidores esperam apenas obter lucro com o dinheiro aplicado. Entre eles está Beto Sicupira, um dos donos da AmBev, que acaba de comprar a rede americana de comida rápida Burger King.
21
Produção blindada
A preocupação com vazamentos de cenas e trechos do filme se tornou uma obsessão para os produtores e o diretor José Padilha. Tanto que a edição final foi realizada em um apartamento no Rio, em um computador sem acesso à internet. Para evitar que cópias caiam em mãos indevidas, foi contratado também o maior especialista em distribuição do Brasil, Marco Aurélio Marcondes. Até agora, a produção foi muito bem-sucedida em sua estratégia. Só não conseguiu esconder as 21 curiosidades publicadas nesta reportagem.