Antes de decidir comprar o apartamento de 24 metros quadrados em que mora atualmente na Consolação, perto do Parque Augusta, a advogada Edna Coelho, de 44 anos, se submeteu a uma espécie de “estágio” e alugou por um tempo um imóvel de 30 metros quadrados para saber como seria a experiência. “Eu gostei muito e até achei que 30 metros quadrados era bastante espaço para uma pessoa”, diz. Edna integra o batalhão de paulistanos que aderiram ao “menos é mais” quando o assunto é moradia e que são responsáveis pelo boom de microapartamentos na capital. Há cinco anos, em 2018, eles respondiam por 11% do total dos lançamentos, fatia que em 2022 saltou para 21%, segundo dados do Secovi-SP (Sindicato da Habitação de São Paulo). Especialistas e representantes do setor indicam que os motivos incluem desde mudança de comportamento das pessoas, passando pela redução no tamanho das famílias, custo de produção das unidades até a mudança na legislação na capital. “A mudança na lei (Plano Diretor) permitiu a construção de apartamentos mais compac- tos sem vaga de garagem. Do ponto de vista do incorporador, isso gera maior liquidez”, diz o engenheiro Reinaldo Fincatti, diretor da Embraesp (Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio).
“Trabalho bastante e só venho para casa para dormir. Além disso, é bem mais vantajoso financeiramente”, diz a coordenadora comercial Letícia Barrionuevo Brandão, 34 anos, que comprou um microapartamento na Vila Mariana, na Zona Sul. Antes de adquirir o imóvel, ela tentou alugar um. Porém não encontrava nada por menos de 3 000 reais ao mês, exatamente o dobro do que paga atualmente (1 200 da parcela do financiamento e 300 de taxa de condomínio).
Outra vantagem indicada por moradores dessas pequenas residências são os serviços oferecidos pelos condomínios, as chamadas facilidades. Para a relações-públicas Giovanna Paulucci, 28 anos, o fato de o prédio onde mora ter várias delas, que incluem desde cinema, passando por espaço-bar e até uma sala com revestimento acústico para receber bandas, foi determinante para que ela comprasse uma unidade no local. “Praticamente eu não preciso sair do prédio para nada, nem para a balada.”
Letícia e Giovanna são alguns exemplos do público predominante desses imóveis, segundo uma pesquisa feita pelo QuintoAndar com residentes de microapartamentos. A sondagem indicou que 75% têm de 20 a 39 anos, 80% moram sozinhos e entre os principais motivos que os levam a escolher por um apartamento compacto estão a independência (47%), proximidade com o trabalho (44%) e a mobília (36%). “Um apartamento grande, cheio de equipamentos, por exemplo, vai demandar muita manutenção e muitos gastos. Além disso, quanto mais espaço temos em casa, mais acumulamos coisas”, diz a advogada Edna Coelho. Ela pagou cerca de 300 000 reais no microapartamento onde mora. Além disso, precisou investir 100 000 reais para adaptá-lo. “O que as pessoas estão descobrindo é que conseguem viver com o essencial e assim viver melhor a vida. Creio ser um caminho sem volta”, opina o arquiteto Glaucio Gonçalves, que assinou mais de 300 projetos para microapartamentos, incluindo o da casa de Edna.
Ainda não existe um levantamento específico para saber se to- dos os imóveis lançados estão sendo destinados para o consumidor final ou investidores. “A maior concentração desses apartamentos está em zonas ricas da cidade, e não são para baixa renda”, diz Otavio Zarvos, sócio-fundador da Idea!Zarvos. Segundo ele, a maior parte dos microapartamentos existentes nos prédios criados pela incorporadora é adquirida por investidores.
Uma pesquisa exclusiva da startup imobiliária Loft, feita para a Vejinha, indica os locais que concentram a maioria dos anúncios de venda dos microapartamentos: Pinheiros, Perdizes, Vila Clementino, Campo Belo, Vila Mariana, Bela Vista, República, Jardim Paulista, Vila Olímpia e Itaim Bibi. O valor médio do metro quadrado desses apartamentos menores é de 14 000 reais, os mais elevados do mercado, de acordo com o levantamento. Os dados também indicam que nos últimos seis meses os preços avança- ram duas vezes a média da cidade. “Quando você faz um prédio com imóveis pequenos, o custo unitário aumenta, já que ele terá mais paredes do que os apartamentos maiores”, explica Rodger Campos, gerente de dados da Loft.
Entre as empresas que atuam nesse mercado, seis foram consultadas pela reportagem, SETIN, Plano&Plano, Neoin, SKR, Grupo YEES! e Idea!Zarvos. Elas praticam valores que vão de 8 000 reais pelo metro quadrado (caso da Plano&Plano, que vendeu 7 000 unidades com menos de 30 metros qua- drados nos últimos cinco anos, a maioria para a classe C) a 25 000 reais, caso da SETIN Incorporadora, conhecida no mercado pelos produ- tos de alto padrão. A SETIN tem 2 000 unidades de microapartamentos em produção. Dessas, 220 serão entregues no primeiro semestre em um empreendimento específico com microapartamentos na Rua Pamplona, a poucos metros da Avenida Paulista. Segundo Antonio Setin, fundador e presidente da SETIN Incorporadora, a vocação do empreendimento é para executivos que visitam regularmente a capital a negócios e querem ter um espaço só seu.
Facilidades nos empreendimentos
Publicado em VEJA São Paulo de 19 de abril de 2023, edição nº 2838