Em 2004, aos 11 anos, a estudante Jessyca Araujo assistiu em seu colégio a uma exibição do filme Harry Potter e a Câmara Secreta, o segundo episódio da famosa franquia, e apaixonou-se pelo universo criado pela escritora inglesa J.K. Rowling. Nos anos seguintes, acompanhou o lançamento dos demais capítulos no cinema, comprou todos os livros da série e participou de diversas convenções de fãs. Hoje, com 21 anos, acumulou tanto conhecimento a respeito do tema que poderia ministrar palestras sobre magia.
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Sua relação com a saga mudaria em 2012, ao conhecer o projeto Potter em Orfanatos, criado no Rio de Janeiro pela escritora Renata Ventura. Como o nome já explicita, o objetivo é encenar passagens da história do bruxinho em casas de acolhimento infantil. Com a ajuda de outros voluntários que arrebanhou nas redes sociais, Jessyca passou a ser a principal organizadora da iniciativa na capital paulista. Os ensaios começaram em 1º de setembro de 2013 (a escolha foi proposital: trata-se da data de início das aulas no castelo de Hogwarts). Oito meses depois, o grupo passou a fazer as primeiras apresentações.
A inspiração para o tipo de estabelecimento escolhido como foco da ação vem do próprio protagonista, que perdeu os pais na infância. “Todo órfão tem um pouco de Harry Potter”, diz o slogan do projeto, que conta com cerca de 700 membros inscritos em São Paulo e é mantido apenas com doações dos próprios participantes. Sucesso entre os pequenos, o truque aqui não tem mistério: basta colocar a fantasia, empunhar a varinha mágica e representar alguns capítulos da série para enfeitiçar o público. Outros objetos presentes na trama, como o chapéu seletor e os sapos de chocolate, também são usados (veja mais detalhes no quadro abaixo).
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As apresentações costumam ocorrer aos domingos e duram três horas: no final, livros arrecadados com fãs são doados aos orfanatos. “É gratificante incentivar o hábito da leitura por meio das histórias de Harry Potter”, diz Jessyca, aluna do curso de comunicação visual da Escola Técnica Estadual (Etec) de Carapicuíba. “Essas crianças não são dignas de pena, só precisam de atenção”, completa. Outro protagonista do movimento é o estudante Fagner Silva, de 22 anos, órfão de mãe desde os 11. Afastado do pai há alguns anos, atualmente mora com a irmã, o cunhado e o sobrinho. “Os livros foram meus amigos durante muito tempo, então passar isso adiante é muito bom”, afirma. Membro ativo, e uma das integrantes mais novas, Juliana Niel, de 15 anos, organiza encontros sobre o bruxo em convenções geek, como a Anime Friends, e participa das apresentações desde o início do projeto.
O grupo já promoveu vinte visitas a dois lugares: o Instituto Curumim, no Mandaqui, e a Casa de Amparo Tia Marly, em Santana. Somados, abrigam 41 internos, entre 1 e 17 anos. A iniciativa impactou uma menina desse segundo espaço, ainda analfabeta aos 9 anos. Após as visitas, ela se encantou com o tema, passou a folhear os livros e conseguiu juntar sílabas. “Seu sonho é aprender a ler para contar a história a alguém”, afirma Marly Correa do Nascimento, responsável pela instituição em Santana. “Tudo o que envolve arte e literatura é importante para eles”, completa. Nem todos pensam assim: embora a popularidade de Harry Potter seja quase universal, alguns orfanatos rejeitaram os shows. “Era para evitar a exposição das crianças a temas como bruxaria”, diz Jessyca, meio incrédula.
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