A Casa Amarela, como é conhecido o imóvel na esquina da Rua da Consolação com a Visconde de Ouro Preto, é um daqueles edifícios que fazem parte do imaginário da cidade, mas que muitos não conhecem por dentro. Abrigo de uma antiga creche, há 11 anos ela era frequentada apenas pelos seguranças que tomavam conta do espaço. Em fevereiro, porém, a situação mudou com a ocupação de cerca de 100 artistas que fizeram do local um ateliê compartilhado. Proprietário, o INSS entrou na Justiça com pedido de reintegração de posse. Já a prefeitura promete transformar a área em um centro de direitos humanos. Enquanto nada acontece, o grupo segue trabalhando por ali.
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Escolhida por estar em uma região culturalmente privilegiada – fica no meio do caminho entre a Avenida Paulista e a Praça Roosevelt – e por já ser motivo de negociação entre o Ministério da Previdência Social e a prefeitura, a casa foi invadida no dia 20 de fevereiro. Os ocupantes, artistas de diversas companhias de todas as regiões da cidade, cobram do Poder Executivo a criação de espaços culturais que abriguem ensaios e apresentações de forma livre.
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“Os ateliês compartilhados têm sido debatidos há três anos. Apresentamos a proposta para a Secretaria de Cultura para criarmos um a cada ano de gestão. O secretário disse que era pouco, mas não fez nenhum”, explica um dos representantes dos artistas, o dramaturgo Dorberto Carvalho. No primeiro mês de ocupação, a casa de três andares e 27 cômodos recebeu mais de 800 horas de ensaios e 2 500 pessoas. As atividades culturais são majoritariamente teatrais, mas há também cinema, artes plásticas, circo, dança, entre outras manifestações. Para reservar um horário, qualquer grupo precisa apenas enviar um email.
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Como muitos edifícios desocupados, a casa – que é tombada pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico – apresenta problemas estruturais. O telhado precisa ser trocado e algumas instalações elétricas e de água são improvisadas. Além disso, engenheiros que visitaram o local dizem que uma varanda pode até ceder. Para realizar consertos emergenciais, os artistas buscam doações, especialmente dos grupos que serão selecionados pela Cooperativa Paulista de Teatro para se apresentarem na Virada Cultural. “Devemos arrecadar 50 000 reais com a doação dos cachês. Mostrando nosso trabalho, vamos convencer a cidade de que isso é importante”, afirma Carvalho.
Proprietário do imóvel, o INSS entrou na Justiça. O local está sendo negociado para venda direta à prefeitura, que tinha a intenção de transformar o prédio em um centro de direitos humanos, com espaços para memória, exposições, atividades artísticas, palestras, debates e seminários. De acordo com a administração, paralelamente à demanda do centro existe a proposta da Secretaria de Cultura de criar os ateliês compartilhados. “A prefeitura avalia as alternativas possíveis, sem descartar nenhuma delas”, informou por meio de nota.
Enquanto o imbróglio judiciário caminha a passos lentos, os artistas vão se organizando. Alunos de arquitetura do Mackenzie e de uma escola estadual nas proximidades fazem visitas constantes. Vizinhos que aprovam a ocupação ajudam com a doação de móveis e materiais de limpeza. A casa também virou ponto de encontro para discussões institucionais da classe artística, como as do grupo Artistas de Rua, que se reúne ali para planejar ações e protestos. “O ateliê pode ser um instrumento de acesso e fruição cultural. Quanto mais cultura estiver sendo feita na cidade, melhor para todos”, conclui Carvalho.