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Miss Saigon transforma São Paulo na cidade dos musicais

Mais de 2,3 milhões de ingressos foram vendidos desde O Beijo da Mulher Aranha, a primeira grande investida nesse gênero, em 2000

Por Dirceu Alves Jr.
Atualizado em 6 dez 2016, 09h04 - Publicado em 18 set 2009, 20h33
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  • Quando o primeiro espectador entregar seu ingresso na portaria do Teatro Abril, na próxima quinta-feira (12), um novo e ambicioso capítulo de sucesso começará a ser escrito. Não apenas pela trajetória do espetáculo Miss Saigon, história de amor com enredo baseado na ópera Madame Butterfly, de Puccini, que já levou às lágrimas mais de 33 milhões de pessoas em 25 países e se tornou uma das mais disputadas montagens da Broadway de 1991 a 2001. A estréia da versão brasileira de Miss Saigon, sexta superprodução financiada pela CIE Brasil, subsidiária do grupo mexicano Corporación Interamericana de Entretenimiento, representa muito mais. Com o início da temporada da trágica trama da jovem Kim, que se apaixona pelo soldado Chris às vésperas da retirada das tropas americanas do Vietnã, São Paulo se consolida como a cidade dos musicais. Mais de 2,3 milhões de ingressos foram vendidos desde O Beijo da Mulher Aranha, em 2000, a primeira grande investida nesse gênero de espetáculo.

    Musicais importados da Broadway tornaram-se uma das maiores atrações turísticas de São Paulo. A expectativa de Miss Saigon é superar o milhão de pagantes nos dezoito meses previstos de permanência em cartaz – calcula-se que 25% da platéia venha de fora da capital.

    Para atrair público, vale tudo, inclusive gastar. Os custos das produções estão cada vez maiores. Os 12 milhões de dólares investidos em Miss Saigon superam em muito os 3,5 milhões de Les Misérables (2001) ou os 2 milhões de dólares de Chicago (2004). O Fantasma da Ópera, por exemplo, custou 10 milhões de dólares e foi visto por um público de 880 000 pessoas. Detalhe: os ingressos geralmente custam entre 70 e 200 reais. No palco de Miss Saigon estarão 42 atores e dezoito músicos escolhidos a partir da seleção de 2 000 currículos. Sete contêineres trouxeram para São Paulo 50 toneladas de cenário. A emblemática cena do helicóptero, que invadia o palco do teatro na montagem da Broadway, já pertence ao passado. Agora, o mesmo efeito é reproduzido com impacto similar graças a um moderno recurso de computador testado e aprovado nas temporadas da Austrália, Coréia do Sul e Inglaterra. “Miss Saigon é um espetáculo muito mais ligado ao desempenho dos atores que ao apelo visual”, diz o diretor americano Fred Hanson, responsável também pela montagem japonesa do musical.

    Acostumado ao recato dos orientais, o diretor se surpreendeu com a desenvoltura dos brasileiros na hora de emprestar sentimento aos seus papéis. “Ninguém vê problema em beijar ou abraçar um colega em uma cena de amor ou mesmo em chorar quando é exigido”, afirma Hanson. “No Japão ou na Coréia, é praticamente impossível isso acontecer espontaneamente.” Uma das boas descobertas de Hanson foi Lissah Martins, a paranaense de 23 anos que estréia como atriz na pele de Kim. “Jamais pensei em estudar interpretação”, conta ela, revelada ao Brasil como uma das vocalistas da banda Rouge no programa Popstar, exibido pelo SBT em 2002. Agora, pretende investir no gênero. “Estou fazendo aulas de canto e com uma fonoaudióloga.”

    O grande número de jovens no elenco de Miss Saigon – a idade média é 24 anos – sinaliza que uma nova geração começou a se preparar para o mercado dos musicais. Afinal, paga-se bem. O protagonista de um espetáculo como O Fantasma da Ópera ou My Fair Lady pode receber entre 10 000 e 20 000 reais por mês. Se o ator principal é uma grande estrela, caso de Claudia Raia, a cifra pode beirar os 50 000 reais por mês, acrescida de uma comissão de bilheteria. “Existe uma diferença de 10 para 100 no preparo dos atores se compararmos o que era selecionar elenco para um musical nos anos 90 e o que é agora”, afirma Claudio Botelho, responsável pelas boas versões em português para as canções da Broadway e diretor de, entre outros, Sweet Charity.

    De produções médias e menos ambiciosas, como Garota Glamour e José e Seu Manto Technicolor, até megassucessos do porte do carioca Sassaricando, não faltam oportunidades de trabalho para os atores que dominam o canto e a dança com o grande número de estréias em São Paulo. Investidor do gênero mesmo quando os musicais estavam em baixa, Jorge Takla, produtor e diretor de My Fair Lady, vê com euforia a nova fase. “O artista brasileiro, apesar de talentoso, sempre foi preguiçoso e pecou pela falta de técnica. Agora, parece que acordou”, diz ele. Protagonista de My Fair Lady, Amanda Acosta, de 28 anos, é citada por Takla como exemplo de preparo. “Ela só é dona de uma resistência fantástica, que lhe permite fazer seis ou sete sessões semanais, porque começou cedo e se prepara muito.”

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    O carioca Sandro Chaim, que ensaia, ao lado de Miguel Falabella, Os Produtores, escolheu São Paulo para a estréia porque a cidade já passou por um processo de formação de público. Além disso, reconhece que é muito fácil encontrar mão-de-obra qualificada e casas de espetáculos adequadas por aqui. “Esse boom parece longe de chegar ao Rio”, diz Chaim, que reunirá, no mínimo, 700 profissionais na nova produção. O sócio Miguel Falabella é um dos maiores entusiastas do batismo de São Paulo como a meca dos musicais. Astro de O Beijo da Mulher Aranha, ao lado de Claudia Raia e Tuca Andrada, ele vê com orgulho os passos largos dados pelos artistas da cidade rumo à profissionalização no gênero. “Os gringos que acompanharam as audições de Os Produtores estão de queixo caído”, conta ele. Falabella afirma que para o grande salto só falta os empresários culturais se unirem ao governo municipal ou estadual para criar uma campanha de estímulo turístico aos espetáculos. “Por que não lançar o slogan ‘São Paulo canta’? Vale sempre lembrar que Nova York saiu das cinzas muito por causa do apelo da Broadway.”

    Aos poucos, os musicais já integram a agenda turística da cidade. Aproximadamente 30% da platéia das apresentações de My Fair Lady vem de fora. Muitas cidades do interior de São Paulo agendam excursões, e, pelo menos duas vezes por semana, caravanas dos estados do Norte e do Nordeste chegam ao Teatro Alfa. Agências de turismo e hotéis também preparam pacotes para levar interessados a conferir as emoções de Miss Saigon. “É um procedimento comum nos Estados Unidos e que, até hoje, ainda é muito tímido no Brasil”, compara Falabella. Jorge Takla, que reconhece o efeito da parceria com agências de viagens nas bilheterias de My Fair Lady, diz que essa é uma aposta saudável para todas as produções. “O turista que assistiu a My Fair Lady agora pode voltar em uma próxima visita já interessado em Miss Saigon”, afirma o diretor. E, passo a passo, São Paulo, sempre tão lembrada como a metrópole de tantas ofertas, se consagra como a meca dos musicais brasileiros.

    No palco de Miss Saigon estarão 42 atores e dezoito músicos escolhidos a partir da seleção de 2 000 currículos. Sete contêineres trouxeram para São Paulo 50 toneladas de cenário. Sessenta quilos de gelo serão utilizados por apresentação. Tem mais. A potência do projetor importado é dez vezes superior à de um aparelho convencional usado em shows. O diretor americano Fred Hanson, com a experiência de quem participou da equipe que levou o musical para a Broadway entre 1991 e 1996, diz que Miss Saigon não é só um espetáculo visual. “É uma história para ser apreciada mais com o coração do que com os olhos.”

    12 milhões de dólares

    foram investidos na montagem brasileira. A história, aplaudida por mais de 33 milhões de espectadores em doze línguas diferentes, estreou em Londres, em 1989, e dois anos depois ganhou os palcos de Nova York

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    24 anos

    é a média de idade do elenco do espetáculo, o mais jovem já recrutado entre as montagens brasileiras. Dos 42 atores, apenas oito têm mais de 30 anos

    500 figurinos

    foram confeccionados no país especialmente para o musical. Além de 500 acessórios, como chapéus e cintos, e 336 sapatos sob medida

    100 profissionais

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    estão envolvidos nos bastidores do espetáculo, entre equipe técnica, costureiras, camareiras e contra-regras. Vinte deles são estrangeiros

    O homem das letras

    Foi graças ao cinema que Claudio Botelho despertou para os musicais. Ainda criança, ele assistiu a Oliver!, versão de Carol Reed para a obra de Charles Dickens, e o filme nunca lhe saiu da cabeça. O primeiro grande musical de teatro, Crazy for You, com canções de George Gershwin, esse mineiro de 42 anos só veria ao vivo em 1995, quando resolveu testar em Nova York o inglês estudado desde a adolescência. Voltou três vezes à sala de espetáculos de tão encantado e, desde então, viaja para os Estados Unidos pelo menos duas vezes por ano.

    Em 2006, Botelho bateu seu recorde e carimbou o passaporte quatro vezes. “Não tenho vontade de ir para nenhum outro lugar”, diz o ator, diretor e produtor. Nada mau para quem começou a chamar atenção em produções enxutas como Cole Porter – Ele Nunca Disse que Me Amava e Side by Side by Sondheim e encantou público e crítica com Ópera do Malandro, de Chico Buarque, em 2003. Mas foi como tradutor de musicais da Broadway que Botelho viu a carreira deslanchar. De O Beijo da Mulher Aranha (2000) a Miss Saigon, ele adaptou para o português os versos de todos os grandes espetáculos: Les Misérables, A Bela e a Fera, O Fantasma da Ópera, My Fair Lady e Sweet Charity, do qual também é diretor. “Às vezes dou sorte de pegar musicais que conheço de cor, como Chicago e My Fair Lady, o que facilita muito.”

    O respeito pelas rimas e pelo ritmo dos originais é a tônica do trabalho de Botelho. “A platéia precisa esquecer que está ouvindo uma tradução, por isso eu me considero muito mais um letrista que um autor de versões”, diz ele. Seu atual desafio é adaptar as palavras de Stephen Sondheim em West Side Story, produção com estréia prevista para o primeiro semestre de 2008. “Estou apanhando para chegar às versões finais porque são canções muito populares e preciso dar personalidade a cada uma delas”, diz.

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    Os galãs da Broadway brasileira

    Daniel Boaventura

    O Professor Higgins de My Fair Lady descobriu os musicais no palco. Depois de participar de Company, em 2000, o baiano de 37 anos percebeu o nicho a ser explorado. Aulas de canto e dança com afinco renderam o estrelato em A Bela e a Fera e Chicago e a fama de galã do gênero. “Já passei por oito professores de canto e vou investir mais”, diz. “A exigência não vai diminuir.”

    Marcos Tumura

    Há duas décadas este paranaense dedica-se quase exclusivamente aos musicais – entre 2001 e 2007, emendou Les Misérables, A Bela e a Fera e O Fantasma da Ópera. Desde a estréia com Splish, Splash, Marcos Tumura conquistou a certeza de que o gênero é seu ganha-pão. “Recusei a novela Sete Pecados. Poderei fazer TV com 70 anos”, afirma. “Miss Saigon é agora ou nunca.” Em média, um protagonista de musical como ele recebe 10 000 reais por mês.

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    Saulo Vasconcelos

    Ao ser testado para Les Misérables, Saulo Vasconcelos, 33 anos, não tinha concorrência. Em 2001, ele já havia protagonizado O Fantasma da Ópera no México. “Na época, o mercado era incipiente”, diz o ator, que ainda fez A Bela e a Fera e o mascarado da montagem de 2005. Na seleção de Miss Saigon, porém, Saulo foi reprovado. “O Nando Prado venceu com louvor, o que prova a seriedade das audições.

    Nando Prado

    Em 2000, quando soube que a CIE Brasil investiria em musicais, Nando Prado foi para Nova York assistir a algumas produções. “Queria saber como me adequar ao perfil dos personagens”, conta o ator de 28 anos. Depois de brilhar em A Bela e a Fera, Chicago e O Fantasma da Ópera, ele realiza o sonho de viver Chris em Miss Saigon. “Eu me sinto no topo com esse espetáculo.”

    O que vem por aí

    Antes mesmo da estréia de Miss Saigon, o produtor inglês Cameron Mackintosh já aguça a expectativa do público. A próxima parceria dele com a CIE Brasil, prevista para 2009, deverá ser Mary Poppins, atualmente em cartaz nos palcos do West End londrino. Sobre a adaptação da história da babá que desce dos céus para animar os filhos de um casal, Mackintosh ainda tem pouco a contar. Resume que é uma montagem divertida, perfeita para o espírito dos brasileiros, que cada vez mais freqüentam as salas de espetáculos. “Tenho prazer em ver como o teatro cresce no Brasil e como os atores daqui interpretam com paixão”, diz ele.

    Enquanto Mary Poppins não aterrissa em São Paulo, a próxima superprodução a ser descoberta é Peter Pan – Todos Podemos Voar, com estréia marcada para o dia 27 no Credicard Hall. O elenco conta com 27 atores escolhidos entre 3.000 pessoas pelo diretor argentino Ariel Del Mastro, que realiza o primeiro trabalho no país. “Fiquei impressionado com a qualidade dos candidatos”, afirma Del Mastro, que elegeu o global Leonardo Miggiorin para o papel principal. O ator e diretor Miguel Falabella, que está na reta final das audições para Os Produtores, de Mel Brooks, com estréia prevista para 13 de setembro no Tom Brasil, também se mostra satisfeito com a talentosa safra de atores de musicais. “Fiquei com vontade de montar a Bíblia só para ter personagens de sobra e não dispensar a maioria dos 1 000 inscritos”, brinca. “Minha geração não gastou um centavo com cursos de dança e canto porque não tinha mercado. Hoje os jovens estão preparados.”

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