Na série Jornada nas Estrelas, quando um tripulante tinha um desejo, apertava o botão de uma engenhoca chamada “replicador”. Ela era capaz de materializar ou duplicar no mesmo instante qualquer objeto, de um sanduíche a uma peça para a nave espacial. Vários paulistanos começaram a descobrir que a ficção científica já não está tão distante assim da vida real, graças às impressoras 3D.
Trata-se de máquinas que fabricam qualquer tipo de objeto de plástico ou resina a partir de uma imagem tridimensional desenhada no computador. Quando a tecnologia surgiu, nos anos 80, ela estava restrita ao uso industrial. A partir de 2010, no entanto, esses aparelhos passaram a ser adotados para fim doméstico, porque o manuseio se tornou mais fácil. Nos últimos anos, a queda no preço das máquinas também ajudou a popularizar sua utilização.
Os adeptos desses equipamentos têm um quê de professor Pardal, caso do engenheiro eletrônico Gustavo Brancante, que construiu o seu sozinho, seguindo tutoriais na internet. Nas horas vagas, ele desenha, imprime e monta membros artificiais para deficientes físicos.
Batizado de Open Arms, o projeto tem hoje cinco peças em desenvolvimento, entre elas uma “mão de robô”, pensada para um garotinho de 7 anos que nasceu sem os dedos. “Esse tipo de prótese não custa menos que 30 000 reais”, diz ele. “Na versão impressa, o valor cai para, no máximo, 600 reais.”
Por enquanto, Brancante toca tudo sozinho, com investimento próprio. Com a repercussão da ação, recebeu propostas de empresas e de pessoas dispostas a ajudar. “Tenho o meu trabalho e não faço isso para ganhar dinheiro. Quero que o Open Arms seja colaborativo e autossustentável”, completa.
Outro que explora o emprego profissional da impressora é o modelador Mauricio Faria. Ele comprou o aparato em outubro com a intenção de usá-lo como um passatempo, mas descobriu possibilidades de lucro compondo protótipos. “Comecei a receber encomendas após descrever o processo em uma página no Facebook, a 3DME”, conta.
Com o sucesso da empreitada, em janeiro ele arrematou também um scanner 3D para digitalizar o molde de qualquer objeto. Por ora, sua maior façanha foi “escanear” o próprio rosto, que, depois da impressão, se transformou num minibusto.
Na maior parte das vezes, porém, a tecnologia está a serviço de algum hobby. O projetista aposentado José Carlos Duarte encontrou na impressora a saída para um problema sem solução: ele precisava de uma capa de guidão para restaurar sua Lambretta Lambro, de 1961, acessório que há anos não é fabricado. “Deu certo só na segunda tentativa, mas ficou bonito”, fala, orgulhoso. Agora, empenha-se em fazer miniaturas de carros antigos.
Também como um passatempo,o corretor de imóveis Daniel Olivier adquiriu sua máquina em setembro. “Sempre fui fã de desenhos em 3D e percebi que podia transformar minhas criações em algo real”, explica. Desde então, calcula ter feito mais de 300 utensílios domésticos, como suporte para celular, saleiro e saboneteira. “Minha mulher é minha principal cliente”, brinca.
Os fabricantes comemoram a expansão do uso do equipamento. Em dois anos, a Robtec Brasil, revendedora da marca americana 3D Systems, sediada em Diadema, vendeu cerca de 160 unidades, que custam a partir de 5 800 reais. Há a expectativa de crescer 70% em 2014. A Metamaquina, empresa na Bela Vista pioneira na produção de impressoras 3D no país, comercializou 150 desde 2012 e pretende dobrar esse número até dezembro.
A procura por esse produto abriu espaço para oficinas como o Garagem Fab Lab, na Bela Vista. Inaugurado no fim de 2013, o endereço oferece cursos sobre como manejar as máquinas, executa pequenos trabalhos para terceiros e elabora projetos para empresas. ”Imprimimos desde fósseis até protótipos de ursinhos de pelúcia”, descreve Marco Rossi, sócio do negócio. A cópia de uma peça de 15 centímetros custa a partir de 300 reais e fica pronta em até quatro horas. “As pessoas podem criar tudo o que imaginarem”, afirma.
Fábrica em casa – Como funciona esse tipo de equipamento
- Primeiro, é preciso ter um software de desenhos em 3D para criar o modelo que se pretende “imprimir”. Para quem não sabe projetar, há diversos sites na internet que disponibilizam moldes prontos.
- Depois de desenhada, a peça é enviada à impressora.
- Por meio de um bico, fios milimétricos de plástico ou de resina são expelidos e constroem os objetos por camadas. O tamanho dos protótipos varia conforme a capacidade da impressora — os modelos da 3D Systems (foto) têm até 14 centímetros de altura.