O produtor musical e professor de música João Igo Santos Silva, 37 anos, e o lutador Felipe Patricio Lino Ferreira, de 20, foram presos acusados de terem cometido dois roubos na região de Pinheiros, na noite do dia 2 de janeiro. No entanto, as vítimas não os reconheceram como autores dos crimes.
De acordo com o Boletim de Ocorrência registrado na 89º D.P. Jardim Taboão, um homem e uma mulher foram assaltados na rua Paes Lemes por volta das 21h, no dia 2, um sábado. Ela afirma que os assaltantes levaram sua bolsa, R$ 150,00, o celular e seu documento de identificação. Depois, os assaltantes foram até o terminal de ônibus de Pinheiros, seguidos por um motorista de aplicativo.
O motorista informou aos PMs que os suspeitos haviam embarcado no Terminal Campo Limpo. Aproximadamente às 22h, o ônibus foi interceptado e os dois foram detidos. Segundo o depoimento de Igo e Felipe, que são moradores do Campo Limpo, eles comeram um yakissoba no Largo da Batata, passaram em caixa eletrônico para sacar R$ 20,00, perderam o ônibus e precisaram esperar pelo próximo antes de embarcarem para casa.
O advogado de defesa, Vanderlei Lima Silva, vê irregularidades na ação conduzida pela Polícia. “Quando eles foram abordados no ônibus, [os policiais] pediram para todos descerem e os dois foram presos. Só que eles não possuíam nada da vítima”, explica à VEJA São Paulo. Ele ainda conta que, como o veículo tinha as janelas lacradas devido ao ar condicionado, é impossível que eles tenham se livrado de quaisquer pertences dentro do ônibus, como é a hipótese registrada pelas autoridades.
Silva ainda ressalta que a prisão faz menos sentido devido ao não reconhecimento dos dois como assaltantes por parte das vítimas do crime. “Na delegacia, a vítima não reconheceu. Não tem sentido ratificar uma voz de prisão se não tem autoria e se não tem materialidade”. Conforme registrado no B.O., o homem não reconheceu nenhum dos suspeitos e a mulher diz que reconheceu apenas as roupas.
O advogado afirma ainda que o reconhecimento foi feito de maneira irregular. Segundo a defesa, eles estavam sozinhos, sem a presença de outras pessoas semelhantes para comparação, o que é previsto em lei.
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Irene Maestro, também advogada, conhece Igo e Felipe do movimento social Luta Popular, do qual os dois participam. “Conheci [os dois] através dessas organizações comunitárias e também em torno do tema da cultura, que é o campo onde eles mais se envolvem no movimento”.
Junto com o irmão de Igo, Ayo Shani, ela refez o trajeto percorrido pelos dois amigos na noite do dia 2. Durante o caminho, pediu imagens aos estabelecimentos comerciais com câmeras. Os dois conseguiram acesso a seis gravações que, segundo eles, comprovam que Igo e Felipe não cometeram o crime.
“Praticamente conseguimos a sequência do caminho deles. Primeiro, vimos que o trajeto relatado corresponde ao que a gente visualizou nas imagens. Isso significa que, no horário que aconteceu o crime, por volta de 21h, eles não estavam na rua Paes Leme. Eles estavam saindo do Largo da Batata e entrando no começo da rua Butantã”, conta.
Além disso, Irene reforça que eles não estavam com nenhum dos pertences da vítima. “Poucos minutos após o assalto, eles são vistos andando tranquilamente, sem nenhum objeto na mão, numa evidente postura de alguém que não está em fuga”. Veja a seguir imagens registradas às 21h26 a partir de um estabelecimento nas redondezas. Elas mostram Igo e Felipe andando após a ocorrência do crime.
Motorista que não viu o crime reconheceu Igo e Felipe
Após o assalto, o homem e a mulher encontraram um motorista de aplicativo. Pediram ajuda e descreveram como seriam os criminosos. O condutor afirmou que seguiu duas pessoas até o terminal, ligou para a Polícia Militar e, na delegacia, foi o único a confirmar Igo e Felipe como os responsáveis pelo crime.
Porém, de acordo com as gravações obtidas pela advogada, a dupla não estava sendo seguida por nenhum carro. “A testemunha que reconheceu eles como autores do crime, que sequer viu o crime acontecer, disse que acompanhou os suspeitos em todo trajeto até a entrada no terminal. Os seis vídeos que temos mostram uma sequência de imagens do caminho e não aparece nenhum veículo seguindo eles”.
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Mobilização internacional
Entidades e movimentos se manifestaram em prol da soltura de João Igo Santos Silva e Felipe Patricio Lino Ferreira. Em uma nota intitulada “Liberdade imediata para Igo e Felipe”, assinaram grupos como Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal de São Paulo e o Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo, além de grupos políticos como PSOL-SP e PSTU.
Entidades internacionais também fizeram uma nota a favor da liberdade dos dois, organizada pela Rede Sindical Internacional de Solidariedade e de Lutas. Cerca de 90 grupos assinaram essa petição.
O que diz a SSP
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou em nota que “os suspeitos foram presos em flagrante e a ação foi fundamentada pelos depoimentos de três testemunhas, duas vítimas e em um auto de reconhecimento pessoal. A prisão preventiva dos dois foi decretada pela Justiça em audiência de custódia.” O Ministério Público aguarda a distribuição do caso.
Até a publicação desta reportagem, o pedido de habeas corpus do advogado de defesa de Igo e Felipe, protocolado no dia 7 de janeiro e distribuído no dia 13 para o relator, está nas mãos do desembargador Fábio Gouvêa.
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