Um dos principais nomes da TV e do rádio brasileiros, o apresentador da Rede Bandeirantes Milton Neves acusa um ex-funcionário de ser o mentor de um desvio de 2,5 milhões de reais por meio de notas fiscais sem a comprovação de serviços prestados. O valor pode ser cinco vezes maior, pois há indícios de saques indevidos e pagamentos com cheques cujas assinaturas não batem com a verdadeira.
Evandro Cesar Cesarino Ribeiro, que atuou por mais de vinte anos como gerente na empresa de publicidade Terceiro Tempo, foi indiciado pela Polícia Civil, em 29 de janeiro, por furto qualificado, pelo abuso de confiança e pelo concurso de agentes. Esse último inciso se refere à suspeita de Ribeiro ter cooptado dois funcionários que respondiam a ele. A dupla, um motoboy e um auxiliar de escritório, abriu empresas e também emitiu notas. Ambos confessaram o crime e foram indiciados, mas se dizem arrependidos e ajudam a vítima na obtenção de provas. A pena de detenção para o caso de condenação é de até quatro anos. Ribeiro nega as acusações e diz que o dinheiro recebido a mais era oriundo de prestação de serviço para gerir os imóveis de Milton Neves (veja relato de seu advogado ao final da matéria).
O caso começou a ser desvendado em março do ano passado, quando Ribeiro foi demitido. Alertado por um dos funcionários que participavam do esquema, Milton Neves havia determinado que seu ex-gerente recebesse 20% a mais de indenização trabalhista pelos serviços prestados. Depois da denúncia, a dispensa acabou virando demissão por justa causa.
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Uma parte do método de desfalques funcionava da seguinte forma: com acesso às contas bancárias do patrão, Ribeiro emitia notas fiscais de sua empresa, a E.C.C.R Produção de Imagens e Comércio de Fotografias, ou das firmas dos dois cúmplices (que repassavam parte do valor ao chefe), como se tivesse prestado serviços à Terceiro Tempo, e ele mesmo realizava os pagamentos. Até o imposto, pago normalmente pelo prestador do serviço, saía das contas de Milton Neves.
Ao todo, foram lançadas 554 notas fiscais, entre 2014 e 2017, totalizando 1,7 milhão de reais (2,5 milhões em valores atualizados). Após o indiciamento do trio, o processo, que tem mais de 1 700 páginas, foi remetido ao Ministério Público, que requereu a quebra do sigilo bancário de Ribeiro. Por conter informações confidenciais, a investigação passou a ocorrer em segredo de Justiça. “Confiei a ele toda a minha movimentação financeira em São Paulo, Minas Gerais e Estados Unidos por duas décadas. Sua mãe, minha amiga e conterrânea, me pediu emprego e abriguei o filho dela e nele confiei, lamentavelmente”, diz Milton Neves, que é defendido pelo advogado Sergei Cobra Arbex.
Além dos pagamentos com as notas fiscais, Ribeiro teria realizado saques diários (começaram com 500 reais e depois passaram para 1 000 reais por dia), feitos pelo motoboy da empresa, e custeava despesas pessoais com o cartão de débito do patrão. Entre as movimentações estão pagamentos de parcelas de um apartamento em Poços de Caldas (MG), que posteriormente foi devolvido, seguro de carros e dezenas de viagens na companhia de amigos e familiares, tudo custeado pelas contas de Milton Neves. Em Muzambinho (MG), uma investigação policial também apura a falsificação de cheques. Parte da documentação anexada ao processo foi obtida após a recuperação do HD do computador em que Ribeiro atuava e que teria sido apagado por ele tão logo foi demitido. O fato também é negado por seu advogado.
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“Foram milhares de arquivos recuperados que mostram mágicas financeiras, imobiliárias e turísticas em grupo pelo Brasil e o mundo”, diz Milton Neves, que espera por justiça. “Hoje, só procuro punição ao sujeito. Não por dinheiro, mas por absurdo abuso de confiança. Já convivi com traíras na minha vida profissional de mais de cinquenta anos, mas trairagem de muzambinhense é mais doído ainda. Minha terra não merece estar nas páginas policiais.”
“A CAUSA DO PIRIPAQUE”
Milton Neves, apresentador
“Tive um piripaque em junho de 2020, ao vivo, durante o programa Terceiro Tempo. No dia anterior, fiquei lendo toda a papelada que ele tentou apagar, mas que recuperamos. Na época eram mais de 300 páginas. Passei a madrugada de sábado para domingo sem dormir, lendo tudo aquilo, e não me conformava com o que esse rapaz tinha feito. Eram viagens e mais viagens. No domingo, me senti mal na televisão porque não tinha conseguido dormir. Se o Hospital São Luiz não ficasse ao lado da Band, eu teria morrido.”
“INFAME DENÚNCIA”
Carlos Alberto Cruz, advogado do acusado
“A história contada nessa infame denúncia vem perdendo força a cada instante. Cabe esclarecer que o Evandro foi um funcionário dedicado durante mais de duas décadas e sempre trabalhou com honestidade e dedicação. Sobre os valores que o senhor Milton Neves alega ter sido furtado, cabe a ele provar. O Evandro está tranquilo, sabe de sua inocência e, quando ela for provada, caberá a ele tomar as medidas cabíveis nas esferas cível, criminal e trabalhista.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 17 de março de 2021, edição nº 2729