Aos 21 anos, a colombiana Natalia Rodriguez deixou o conforto da casa dos pais, em Bogotá, para se aventurar num país desconhecido. Desde o começo do ano paga 700 reais por mês para morar num quarto de 5 metros quadrados, sem banheiro, numa república onde vivem outras seis pessoas. A motivação para tanto sacrifício? Estudar numa das melhores instituições de ensino da América Latina e viver numa metrópole com posição de destaque no cenário internacional. A cidade escolhida por Natalia é São Paulo, e a escola dos sonhos, a USP. “Aqui encontro muito mais coisas do que na minha antiga faculdade”, diz ela, que cursa o 7º semestre de antropologia no campus do Butantã.
Natalia está longe de ser um caso isolado. Nunca houve tantos estrangeiros nas salas de aula brasileiras, conforme atesta o número de vistos para estudantes concedidos pelo Ministério das Relações Exteriores — saltou de pouco mais de 6.000, em 2006, para cerca de 16.000 em 2009 (dado mais recente do Ministério). São Paulo é um dos destinos preferenciais da turma. Não há estatísticas oficiais capazes de quantificar o fenômeno na cidade, mas um levantamento feito nas principais instituições paulistanas mostra que o número de alunos vindos do exterior quase dobrou desde 2006, chegando à casa de 2.600 matrículas no ano passado (veja o quadro). Apesar do aumento, estamos longe de ser um grande polo educacional. Na USP, por exemplo, o porcentual de estrangeiros é de 2,8% do total de 56.000 alunos. Em universidades americanas como Harvard e Stanford, essa fatia sobe para 20%. Engatinhamos ainda no tema basicamente por três motivos:
■ Poucas universidades oferecem disciplinas ministradas em inglês.
■ Não há padronização nos currículos brasileiros, o que dificulta a compatibilização entre os cursos daqui e os de fora.
■ As faculdades geralmente não têm alojamentos para receber os alunos.
O paraguaio Rodrigo Báez, de 24 anos, estudante de música da USP, foi um dos que sofreram para achar moradia. Passou por cinco repúblicas desde que chegou a São Paulo, em 2007. “Numa delas havia nove pessoas em dois quartos”, conta. Sua procura terminou há três meses, quando encontrou uma casa confortável no bairro do Butantã, que divide hoje com outros sete jovens. Apesar dos percalços, a adaptação dos alunos estrangeiros normalmente ocorre de maneira rápida. O holandês Elzo Franco Adrian, de 21, veio para cá em janeiro a fim de cursar um semestre de relações internacionais na ESPM e não teve problema em arranjar um teto acolhedor, já que namora uma brasileira. “As pessoas são muito gentis, e ainda me espanto quando vejo alguém rindo no cinema, coisa rara na Holanda”, afirma ele, pivô do time de basquete da faculdade. O entusiasmo por São Paulo não muda nem quando alguns sofrem com os problemas da cidade. Quando chegou aqui, em janeiro, a checa Irena Melounová, 27 anos, que cursa relações internacionais na Fundação Getulio Vargas (FGV), estranhou o fato de não poder circular sozinha na rua de madrugada. Tudo piorou no mês seguinte, quando ela presenciou o assassinato de um colega, morto a tiros num bar nas redondezas da faculdade. “Depois disso, estou saindo menos”, diz. Mas o susto não foi forte a ponto de diminuir seu interesse pelo país. Sua volta para casa, antes prevista para junho, provavelmente será adiada por algum tempo. Nas férias de julho, Irena pretende conhecer as paisagens mineiras descritas em “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, um de seus romances favoritos.
Para elevarem a qualidade do ensino, aumentarem a quantidade de pesquisas e ampliarem a reputação na comunidade acadêmica internacional, várias faculdades daqui intensificaram esforços para multiplicar a captação de estudantes estrangeiros. A USP acaba de criar uma vice-reitoria voltada apenas a relações internacionais. A Faap marca presença desde 2005 em feiras de educação no exterior para divulgar as vantagens de fazer um intercâmbio no Brasil. “Salas de aula com pessoas de várias nacionalidades aumentam a riqueza de um curso”, conclui Renée Zicman, assessora de assuntos internacionais da PUC de São Paulo.