Em 1984, com o objetivo de concretizar o “sonho da casa própria”, os pais de Oziel Evangelista, então com 5 anos, trocaram a ampla residência alugada pela família, em Santo Amaro, na Zona Sul, por uma menor, na longínqua Cidade Tiradentes, no extremo da Zona Leste. Na época quase rural, o lugar era atendido só por uma linha de ônibus, com destino ao Tatuapé. Hoje existem cerca de trinta opções — a mais extensa delas cumpre 35 quilômetros até o Parque Dom Pedro II, no centro.
O processo de urbanização, entretanto, trouxe ao bairro uma série de problemas. “Quando cheguei aqui, quase não havia ruas asfaltadas”, relembra Evangelista. “Agora há, mas outro dia contei mais de 500 buracos nas vias.” Morador da região há três décadas e ex-diretor da Casa de Cultura local, o sociólogo de 37 anos — o único entre cinco irmãos com diploma superior — terá o privilégio, e o desafio, de resolver os pepinos de sua vizinhança. Em 1º de janeiro, ele será empossado como prefeito regional (a recém-criada nomenclatura para subprefeito) do seu bairro, habitado por 200 000 pessoas.
Evangelista é uma espécie de símbolo do novo perfil dos titulares desse cargo. Antes mesmo de decolar rumo à vitória no primeiro turno da eleição municipal, o tucano João Doria afirmava que a ligação direta com o bairro seria um pré-requisito para seus futuros administradores distritais. Assim, há outras “pratas da casa” entre os 32 prefeitos regionais escolhidos.
Nascido e criado em Pinheiros, na Zona Oeste, Paulo Mathias terá a missão de melhorar a zeladoria, remover o comércio irregular e aumentar a participação da iniciativa privada na manutenção de praças do bairro. Formado em gestão pública, ele integrou a campanha à prefeitura e é ex-coordenador do programa estadual Escola da Família. Aos 26 anos, enfrentará a dificuldade extra de trabalhar sob a vigilância atenta do chefe: Doria mora nos Jardins, localizado dentro da prefeitura regional de Pinheiros. “Somos vizinhos. Com certeza, ele vai ficar no meu pé”, diz Mathias. “Meu ritmo de trabalho terá de ser igual ao dele: acordar cedo e dormir tarde.”
Trata-se da quarta ocasião em que o prefeito eleito tenta imprimir uma marca na administração das subprefeituras. Em 2005, José Serra (PSDB) escolheu ex-prefeitos de cidades paulistas para os cargos. Quatro anos depois, Gilberto Kassab (DEM, depois PSD) passou a indicar coronéis da Polícia Militar. Em 2013, Fernando Haddad (PT) deu preferência a engenheiros e arquitetos para os postos. Doria, no entanto, está indo além e alterando as atribuições desses órgãos.
A partir do ano que vem, a nova Secretaria das Prefeituras Regionais vai incorporar a de Serviços (que será extinta) e suas autarquias, como a Autoridade Municipal de Limpeza Urbana. “Varrição, recolhimento de lixo e lavagem de ruas passarão a ser responsabilidade dessa área”, diz o vice-prefeito eleito Bruno Covas, que comandará a pasta.
Eternos objetos de desejo de vereadores, que fazem pressão para indicar seus afilhados políticos às cobiçadas vagas, com salário de 19 000 reais, as subprefeituras sempre estiveram no meio do “toma lá dá cá” municipal. O plano de Doria é acabar com essa “boquinha”, mas especialistas são reticentes quanto à longevidade do plano. “Esse cenário pode mudar quando as votações apertarem na Câmara. Já vimos esse filme em outras gestões”, afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getulio Vargas.