Dilma Rousseff e Lula, lado a lado no altar, mal se olhavam. A presidente só perdeu a cara de poucos amigos e riu quando o infectologista David Uip, secretário do governo tucano, seu par na cerimônia, fez piada sobre a fama de mandão do noivo cardiologista, que cuida da saúde dela: “Você vai presenciar um momento histórico. O Roberto Kalil ouvindo alguém falar sem retrucar: o padre”. Marisa Letícia, ex-primeira- dama da República, motivava dois comentários maldosos: a semelhança com Marta Suplicy (tamanho o estica e puxa) e a quebrada regra de que madrinhas não devem usar preto. Para completar a lista de políticos padrinhos, havia ainda o senador José Serra entre os representantes da noiva, a endocrinologista Claudia Cozer.
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› Assim foi o casamento (na verdade, uma bênção católica pelos dez anos de relação, pois ambos tinham sido casados no passado) mais prestigiado por poderosos em muitos anos. Comentário de uma das presentes: “Se acontecesse um desastre no salão, o Brasil por pouco não ficaria sem linha de sucessão”. Faz sentido. O vice Michel Temer só não compareceu devido a um imprevisto. Mas os dois nomes que assumiriam o país logo depois dele estavam ali: o chefe da Câmara, Eduardo Cunha, e o comandante do Senado, Renan Calheiros.
› Quando anoiteceu no Itaim Bibi, duas horas antes do início da cerimônia, homens do Palácio do Planalto vasculharam cada canto do bufê Leopolldo. Uma comitiva da Presidência havia estado ali na quinta-feira, checado cada porta de saída e colhido dados de funcionários que atuariam na festa, para “verificação”. Lá fora, cerca de 200 seguranças, parte deles à paisana, cercavam o prédio. Os 670 convidados, porém, entraram apenas informando o nome duas vezes (para um bloqueio na rua e, depois, na porta do salão), sem apresentar documento — nada comparado ao matrimônio de Preta Gil, no Rio, dias depois, quando até Malu Mader teve de sacar o RG para provar ser Malu Mader.
› A chegada da presidente ao Leopolldo interditou a Rua Tabapuã por mais de quinze minutos (seu motorista se atrasou após se perder pelo Itaim) e retardou a entrada de Alckmin (que desceu do carro e foi a pé) e Serra (que se irritou com a cena e chegou esbaforido ao lado do secretário de Segurança Pública, Alexandre de Moraes. “A sua segurança não quer deixara minha polícia trabalhar”, esbravejou Moraes para o noivo.
› Lá dentro, enquanto a orquestra tocava, uma batucada surgiu no horizonte sonoro. Aparição-surpresa do Olodum? Não, apenas manifestantes batendo panelas contra as autoridades presentes (Kalil negociou com movimentos anti-PT, mas cerca de trinta indignados quiseram comparecer por iniciativa própria). “Se gritar ‘pega ladrão…’”, cantavam.
› Deveriam se referir não aos políticos, claro, mas ao larápio que afanaria os dois iPhones 6 de David Uip, que deixou os aparelhos na mesa antes de a celebração começar e não os encontrou. “Temos por praxe revistar a bolsa dos funcionários na saída, mas não achamos nada”, disse Chico Lima, sócio do Leopolldo. Há câmera de segurançano teto do salão. Mas um lustre de cristal Baccarat tapava o campo de visão da mesa onde estavam Uip, Dilma, Alckmin, Calheiros, Serra, Cunha e Lula, cujos números telefônicos, em boa parte, estavam registrados na agenda dos gadgets.
› Outra convidada teve mais sorte: desesperou-se ao notar o sumiço de seu bracelete de brilhantes, mas uma copeira achou a joia.
› Dilma jantou antes de ir ao enlace, na base militar do Aeroporto de Congonhas, onde foi penteada por Celso Kamura (ela fez voo bate e volta). Comeu salada e carne. Na festa (onde dois garçons exclusivos serviam sua mesa), deixou antepastos intocados no prato. Firme na dieta, perdeu 16 quilos desde o ano passado. Estava elegante num longo azul-marinho de crepe georgette de seda pura e bordado de renda francesa — ela fez quatro provas do vestido no ateliê de Juliana Pereira, em Porto Alegre, a mesma estilista da posse.
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› Na sala reservada aos padrinhos, Dilma deu bronca no noivo. “Entregue já esse celular a alguém!”, disse, enquanto Kalil falava com Claudia, que se aproximava.
› Também estavam presentes os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça), os senadores Omar Aziz e José Agripino Maia, que conversou longamente com o médium João de Deus. “Já atendi boa parte das pessoas que estão aqui”, observava.
› No total, foram 670 pessoas, em uma noite com custo estimado em 1 milhão de reais. Foram 3 000 orquídeas suspensas do teto mais um jardim com 1 000 tulipas e show de Tiago Abravanel, que fez os convidados chacoalhar as joias ao som de canções de grupos como Molejo.
› Na cerimônia, a noiva foi elogiada pela delicadeza do vestido do estilista Junior Santaella. Kalil, de terno Ricardo Almeida, surpreendeu ao subir ao palco tocando quarenta segundos de Imagine, de John Lennon, no saxofone. Conta que começou a aprender o instrumento no fim de 2014 mas dispensou o professor há dois meses. Ainda assim, não se ouviu nenhuma nota fora do lugar. “Olha, colocamos fundo de teclado gravado no estúdio, mas o sax aconteceu ao vivo”, garante a organizadora Bia Aydar. Seria playback? “Ninguém jamais saberá”, brincou Kalil.
› Entre as ausências, o cantor Roberto Carlos, que fez uma doação de 12 000 reais à Fundação Zerbini, que gere o Incor, instituto cardiológico do Hospital das Clínicas comandado pelo noivo. Este sugeriu tais depósitos como opção de presente (Dilma mandou um quadro de um artista plástico goiano).
› Para Claudia e Kalil, a festa terminou às 3 horas. “Tomamos um banho em casa e corremos para o aeroporto. Se deixasse a viagem para o dia seguinte, o Kalil iria acabar passando no Sírio-Libanês — e adeus, lua de mel”, disse ela, por telefone, já acomodada no luxuoso Hotel Quisisana, em Capri, na Itália. “Sou médico de tanta gente, é natural que tivesse um casamento grande”, concluiu ele, tentando disfarçar a habitual imodéstia de quem tem o poder de colocar inimigos lado a lado para rezar em coro o pai-nosso.