No café da manhã da coach Daniele Zukerman, o copo de leite, os ovos mexidos e os iogurtes estão fora do cardápio há cinco anos. Por ali, a maior parte da família, incluindo os filhos Eduardo, de 11 anos, e Alice, 4, não consome nenhum tipo de alimento de origem animal. Tudo é preparado de acordo com a filosofia vegana, que prega o consumo de ingredientes e matérias-primas que não envolvam sofrimento nem exploração animais.
Ou seja, além de carne, não valem mel nem mesmo gelatina (que traz colágeno do boi), por exemplo. Itens cuja produção demande testes em bichos ou artigos como lã e couro também são vetados. “O Eduardo, que optou pela prática para acompanhar meu estilo de vida, leva orgulhoso para o colégio meus bolos”, comemora Daniele. O único que come, às vezes, alimentos sumidos da dieta dos irmãos é o filho mais velho, Fernando, 12.
Pacientes interessados em manter hábitos como os da família Zukerman aparecem em números crescentes em consultórios de pediatras e nutricionistas da cidade. De olho no aumento dessa população, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) lançou, no ano passado, um guia de orientação para os médicos que atendem essas pessoas. A última pesquisa divulgada pelo Ibope Media sobre o assunto, em 2012, estima que pelo menos 7% dos paulistanos cortaram a carne de sua rotina alimentar, ou seja, são vegetarianos. Vale dizer que o veganismo é uma prática bem mais restritiva.
“Trata-se de uma alimentação segura para quem realiza sempre acompanhamento médico”, garante a especialista Mônica Moretzsohn, do Departamento Científico de Nutrologia da SBP. “Essas crianças acabam ingerindo gorduras de melhor qualidade e não têm problemas com taxas prejudiciais de colesterol.”
A substituição de ingredientes é o grande segredo para conseguir os nutrientes abundantes em carne de vaca, peixes e frango. “O cálcio, comum nos laticínios, é encontrado também nas folhas verde-escuras, como a couve”, diz a nutricionista especializada no assunto Ana Ceregatti. Em seus consultórios, na região de Pinheiros e em Campinas, 40% dos pacientes são gestantes ou crianças veganas e vegetarianas.
Nem todos os desafios ocorrem na cozinha. A convivência com outras crianças foi motivo de apreensão para a veterinária Camila Violante, 39, há sete anos vegana devido à preocupação com o sofrimento dos bichos. Por não aceitarem a dieta de seus filhos, Heitor, 10, e Helena, 8, os colegas se negavam a almoçar com eles. “A minha filha chorava muito por não ter amigos”, lamenta Camila.
Os pequenos viraram adeptos da prática desde cedo — assistiram com a mãe, por exemplo, ao documentário A Carne É Fraca, de 2004, a respeito dessa indústria, e são treinados a ler rótulos. Hoje em outro colégio, os garotos são discretos ao falar de seu estilo de vida e levam chocolates especiais às festas de aniversário para substituir o brigadeiro, sem ficar de fora da diversão.
Apesar do crescimento do interesse por essa filosofia, os médicos estão longe de um consenso sobre o assunto. Presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Durval Ribas Filho aconselha evitar o veganismo até os 7 anos. “Uma proteína como a carne, com alta concentração de aminoácidos, muito necessários nessa fase de formação, não existe no mundo vegetal. O que mais se aproxima é a soja, mas sem ser igual”, afirma. “Sabemos que ingerir grande quantidade de carne vermelha faz mal, mas a ausência dela na infância também traz prejuízos.”
Sem crueldade
Três produtos infantis que se dizem veganos
Fralda descartável > 43,90 reais. Casa Orgânica. Rua Fidalga, 346, Vila Madalena
Papinha de frutas e legumes > 9,50 reais. www.emporiodapapinha.com.br
Óleo de calêndula > 117,90 reais. www.weleda.com.br