A voz do personagem que fala “elado” e adora esconder o coelhinho azul da Mônica, na verdade, não é de um menininho. Em 1982, Angélica Santos estava em estúdio fazendo teste de voz para dublar a Magali, quando o próprio Mauricio de Sousa decidiu fazer uma mudança. “Ele disse que a minha voz era perfeita para o Cebolinha”, conta a dubladora. Desde então, a moça troca o “R” pelo “L” para dar vida ao garotinho.
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Assim como Angélica, outros paulistanos são responsáveis por não um, mas vários personagens de desenho, séries e filmes. Só a dubladora já fez Kevin Arnold, de “Anos Incríveis”; Huguinho, Zezinho e Luisinho, os sobrinhos do Pato Donald; e Macaulay Culkin, em “Quem Vê Cara Não Vê Coração”. “Quando era adolescente, fiz muitos personagens meninos porque tinha a voz um pouco rouca”, lembra a paulistana que atualmente trabalha na dublagem da advogada Jane, de “Drop Dead Diva”, e Charlotte, de “Sex and The City”, entre outros.
Com o crescimento da programação em português — inclusive em canais pagos, como a Fox, que tem quase 100% de suas atrações dubladas com opção de áudio original e legenda —, a busca por dubladores aumentou. “Antes, o Rio de Janeiro concentrava boa parte das dublagens com os estúdios da Herbert Richers. Hoje, São Paulo já produz bastante”, afirma Luiz Antônio Lobue. O paulistano conta que, quando começou na área, não existiam cursos para se especializar e o aprendizado se dava nos estúdios, onde todos dublavam juntos. “Você aprendia observando os mais experientes e interagindo em cena”, recorda.
Hoje as coisas mudaram. Quando grava as falas sarcásticas e ácidas do Dr. House, personagem que dubla há oito anos, Loube está sozinho no estúdio. “Cada um grava seus anéis [trechos de 20 segundos] separadamente. É raro nos reunirmos para fazer uma cena juntos, como antigamente.”
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Outra mudança foi a entrada de crianças no segmento. Em meados dos anos 80, quando Wendel Bezerra emprestou sua voz para Corey Feldman, personagem do longa “Conte Comigo”, os outros dubladores o observavam com surpresa. “Era o único garoto de 10 anos a dublar uma criança no filme, os outros meninos eram feitos por adultos”, afirma. Naquela época, o mais comum era uma mulher interpretar personagens infantis. Exceção à regra, Wendel dublou a série “Super Vicky” e os filmes “Sem Licença para Dirigir” e “Mulher Nota Mil”, entre outros. Mais recentemente, precisou desenvolver uma voz estridente e acelerada para Bob Esponja.
Um tom para cada personagem
Para dar a risada marcante da esponja de calça quadrada e conseguir falar tão rápido, Wendel precisou se adaptar ao longo do mais de 10 anos de trabalho. “No começo, não conseguia pronunciar todas as palavras e, às vezes, chegava a sair sem voz dos estúdios”, conta. Ainda hoje Bob Esponja dá canseira no dublador. “Em episódios em que ele grita muito, costumo gravar apenas meia hora para não perder a voz.”
Segundo Ulisses Bezerra, responsável pela voz do personagem Charlie Brown, de Charles Schulz, outra dificuldade enfrentada é a censura imposta pelas distribuidoras e canais. “Já dublei filmes policiais em que era proibido dizer ‘bater’ ou expressões consideradas agressivas. Por isso, em cenas violentas, tínhamos de falar ‘vou te acertar’”, por exemplo. Para o dublador com mais de 20 anos de experiência, essa limitação muitas vezes interfere no sentido do filme e prejudica o resultado. “No final, todo mundo nos culpa por esses ‘erros’ de dublagem. Acabamos nos tornando os vilões.”
Para quem quer se aventurar na área, Ulisses Bezerra tem uma boa notícia: o mercado está carente de vozes. Confira aqui lista com escolas paulistanas especializadas em dublagem.