Do lado de fora, o carro de som informa aos moradores de Paraisópolis, na Zona Sul, que a inauguração das Casas Bahia começará em poucos minutos. Dentro da loja, Michael Klein, proprietário da rede, aguarda ao lado do prefeito Gilberto Kassab, alinhado a um cordão de vendedores. Às 9h30 da última quarta, simultaneamente, as onze portas são erguidas ao som do Tema da Vitória, aquela musiquinha grudenta que embalava as vitórias do tricampeão de Fórmula 1 Ayrton Senna. Uma queima de fogos toma o céu. Em seguida, no palco improvisado na entrada da loja, os integrantes do grupo Exaltasamba surgem em cena, levando a platéia ao delírio. O show dos pagodeiros foi o desfecho de uma operação iniciada há um ano para instalar em Paraisópolis a primeira das 550 lojas da rede dentro de uma favela. Após adquirir o terreno de 1 500 metros quadrados na Rua Ernest Renan, principal via comercial da região, a diretoria das Casas Bahia procurou a prefeitura e conseguiu antecipar obras de saneamento ali. Outra negociação resultou em uma espécie de “caminhão do Michael Klein”. A União dos Moradores de Paraisópolis recebeu mais de 100 produtos. “Perguntamos o que poderíamos fazer para melhorar a vida deles”, conta Klein. “Pediram alguns eletrodomésticos e nós doamos.”
A catadora de lixo Conceição Santos Pereira, de 29 anos, ganhou TV, geladeira, armário e panelas. “Um incêndio destruiu minha casa há dois meses”, lembra. Em busca de ajuda, procurou a associação e foi atendida. Segundo o presidente da União dos Moradores, Gilson Rodrigues, cada uma das quinze salas de aula do projeto de alfabetização mantido pela entidade ganhou um rack, uma TV, um DVD e um computador. Os demais produtos da lista foram distribuí-dos “apenas aos mais necessitados”, como era o caso de Conceição.
Além da despesa com os presentes, cujo valor não foi divulgado, a empresa gastou mais 2 milhões de reais para pôr em funciona-mento a nova unidade. A expectativa da rede é faturar 1,5 milhão de reais por mês com as vendas em Paraisópolis – número seme-lhante ao das filiais de Pinheiros e Santo Amaro. Cercada por edifícios residenciais de luxo, a favela se estende por 800 000 metros quadrados e reúne 60 000 habitantes com renda familiar de 1?245 reais. Estima-se que existam ali 2 000 endereços comerciais, entre salões de beleza, locadoras, casas de materiais de construção e mercados. Mas não há uma só loja de departamentos. Justa-mente por isso, a novidade assustou algumas pessoas. “Chegamos a achar que poderia atrapalhar o comércio local”, diz Rodrigues. Após um encontro com a diretoria da rede, ele – que garante não ter ficado com nenhum dos presentes – percebeu os benefícios relacionados à vinda do concorrente de peso. Entre janeiro e agosto, a prefeitura recuperou o asfalto no trecho próximo à loja. Insta-lou também novas tubulações de água e esgoto na Rua Ernest Renan, beneficiando as Casas Bahia e 300 residências. Apenas 30% dos 18 000 domicílios da favela, no entanto, estão conectados ao sistema de água e esgoto.