Vale a pena visitar exposição de arte em formato drive-thru?
A DriveThru. Art, com curadoria do galerista Luis Maluf, ocupa os mais de 8 000 metros quadrados da Arca, na Vila Leopoldina
Com galerias e museus fechados — e os olhos um tanto cansados das telas —, recebi com empolgação a notícia da abertura de uma exposição de arte na cidade no último dia 17. A DriveThru.Art, com curadoria do galerista Luis Maluf, ocupa os mais de 8 000 metros quadrados da Arca, na Vila Leopoldina. A última vez que eu passei por lá foi na Feira dos Campeões da VEJA SÃO PAULO, em março do ano passado. No lugar das barraquinhas com comidas deliciosas, agora encontrei cones. Eles criam um trajeto pelo qual é possível passear devagarinho de carro para acompanhar as obras de dezoito artistas. Funciona assim: você pode comprar pela internet o ingresso para o carro particular (40 reais para no máximo quatro pessoas) ou um lugar de passageiro num carro da produção constantemente limpo (30 reais para até três pessoas, desde que sejam moradores da mesma casa). Ao chegar, de máscara, claro, tive a temperatura medida e pude escanear um QR code para ouvir a descrição das obras.
A proposta da mostra é: “Arte em circuito, vida em movimento”. Ainda que todos os necessários protocolos de segurança e higiene seguidos por lá gritassem na minha cabeça “Que loucura estamos vivendo!”, ali eu respirei aliviada por lembrar que a arte na nossa cidade nunca parou.
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Em formato que lembra o de outdoors, com 9,5 metros de largura por 4,8 metros de altura, os trabalhos têm técnicas diferentes. Entre as peças impressas estão a fotografia Ofélia Munduruku, de Raquel Brust, e Não Estamos Sozinhos, de Felipe Morozini, cuja mensagem me pareceu ao mesmo tempo um acalanto e um chamado à nossa responsabilidade por todos. Nenhuma obra me chamou tanta atenção, porém, quanto 2020: O Fim do Começo, de Cranio. No áudio da visita guiada, o nome aparece trocado, como “O Começo do Fim”. Ao observar o cenário verde intenso com a figura do índio azul paramentado com uma máscara branca sobre o nariz e a boca ao centro, eu me peguei pensando em que ponta da história estamos, se no princípio ou no final… Antes de terminar a divagação, porém, uma gentil guia do espaço aproximou-se e me pediu que cumprisse o tempo máximo de dois minutos em cada uma das paradas, porque havia outro carro logo atrás. Em tempo: a capacidade máxima é de até vinte veículos simultaneamente no local.
Em algumas paradas, minha vista teve vontade de olhar mais de perto. Caso eu estivesse numa exposição convencional, seria o momento que daria um passo a mais, no limite da faixa amarela. Rolou com Carne Viva, de Luiz Escañuela. Os detalhes do mapa da Amazônia, coberto com uma textura de pele cheia de ferimentos nos locais onde houve focos de queimada e desmatamento, parecem escapar nessa distância em que são apresentados. A mesma sensação não se repete diante de artistas que têm como principal linguagem os painéis gigantes. Na última volta, Caminhada, de Apolo Torres, traduz muito da melancolia e resiliência experimentadas neste período. Na pintura, uma mulher e um homem, ambos idosos, miram o horizonte, cada um com uma xícara na mão. Acompanhando a direção dos seus olhares, o visitante chega ao painel final, com uma mensagem de agradecimento: “Que você leve para casa um combo de esperança, inquietação e empatia”. Montada em apenas duas semanas, a DriveThru.Art ainda não é como um passeio cultural de antes, e nem poderia ser. Mas dá conta do recado de inspirar nos paulistanos a vontade de contemplar a vida e a arte, nem que seja da janelinha do carro.
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DriveThru.Art.
Arca. Avenida Manuel Bandeira, 360, Vila Leopoldina. Quarta a domingo, 13h às 21h. R$ 30,00 (ingresso de passageiro) ou R$ 40,00 (veículo particular). Até 9 de agosto. drivethru.art.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 29 de julho de 2020, edição nº 2697.