Restaurantes veganos de cara nova fazem receitas saborosas de verdade
Endereços de salões modernos e cardápios variados atendem à exigência crescente de paulistanos fãs de uma mesa sem nenhum produto de origem animal
Restritivo, sem graça, quase impensável. Até pouco tempo atrás, essas eram algumas das impressões que parte das pessoas tinha a respeito do estilo de vida vegano. Ainda que a decisão de deixar de lado qualquer produto de origem animal continue exigindo uma boa dose de determinação e paciência para ler embalagens, o jogo virou.
Quais são os melhores restaurantes veganos de SP
“Antes não era cool, agora a percepção está mais simpática. Pessoas de diversas profissões passaram a considerar a possibilidade de mudar seus hábitos em nome da saúde e da sustentabilidade”, afirma Alessandra Luglio, nutricionista e diretora da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). Não há dados precisos sobre o veganismo, mas o número crescente de vegetarianos, principalmente nas regiões metropolitanas, dá força à tese. Segundo o Ibope, em 2018 16% dos entrevistados nas grandes cidades se declaravam vegetarianos. Em 2012, eram 8%.
Empresários atentos à demanda passaram a adaptar seus negócios. No fim de março, o Allianz Parque colocou pela primeira vez opções de tortas veganas ao lado de comidinhas tradicionais de estádio, como cachorro-quente. Foi justamente no show de Paul McCartney, garoto-propaganda da campanha Segunda sem Carne, presente em mais de quarenta países. “Vamos avaliar se a oferta é compatível com o público de cada noite”, afirma o gerente Marco Caldeira. Aqueles que investiram de vez no nicho têm encontrado resultados surpreendentes.
É o caso de Maria Cermelli, do Sushimar Vegano. Inaugurada em dezembro de 2017 nos Jardins, a casa sempre tem fila na porta. “Quem experimenta essa transição alimentar costuma sentir falta do ritual do japonês, por isso fiz questão de que todos os itens fossem lindos”, conta Maria. No rodízio, os sushis cobertos por ingredientes como coco, aspargo, pimentão, romã e edamame impressionam pela apresentação e acertam na combinação de sabores e texturas, que agradam até mesmo a quem não é adepto.
Se o ativismo vegano já passou por momentos de apontar o dedo para os onívoros, o clima hoje é de inclusão. “Adoro os comentários positivos de quem não é vegano e se permite uma nova experiência ao provar pratos como uma musseline de mandioquinha com almôndegas de cogumelos”, comemora a chef Thainá Andrade, da Casa Raw. Desde novembro o sobrado em Perdizes funciona no jantar, quebrando assim outro paradigma do gênero, focado mais no almoço. O visual dos salões também evoluiu e deixou no passado a pecha de hippie. Nessa nova leva de estabelecimentos, uma pegada moderninha clean predomina.
No Homa, dos chefs José Barattino e Gilson de Almeida, as receitas (60% delas veganas) podem ser provadas numa bela mesa coletiva, em bancadas com bancos altos ou mesinhas ao ar livre na entrada. “Não usamos proteína texturizada de soja, não tentamos imitar uma feijoada sem carne”, diz Barattino. Mas e quando bate aquela vontade de comer uma receita afetiva que tem ovo ou queijo?
Cresceu também a oferta de bons substitutos. Dentro de um hostel no Sumarezinho, a Padoca Vegan buscou suprir uma lacuna matinal. “Café da manhã de padaria é uma instituição paulistana, mas os veganos acabavam tendo de se contentar com um pão com geleia”, acredita Renata Altheman. Na garagem e no quintal, ela e a sócia Denise Consolmagno servem pingado (feito com leite de coco), pão na chapa com azeite, sonho e enroladinho de feijão, no lugar da calabresa. “Já tivemos clientes veganos há décadas que choraram de emoção ao descobrir que podiam voltar a comer em uma padoca.”
A confeitaria fina também entrou na onda. Premiada pelo COMER & BEBER, Mara Mello investe agora na linha Sweet Fit. “Para quem fazia tudo com creme de leite e açúcar, estou mudada”, diverte-se. Sua linha convencional continua, mas são justamente os itens veganos que ela viu decolar no último ano. “Meu padrão de exigência é alto, realizei muitos testes até chegar à torta com nuts, quinoa, chia, tâmara e chocolate de excelente qualidade.” As encomendas vêm por Instagram ou WhatsApp, uma modificação de comportamento que favoreceu o mercado.
Outro campeão pelo guia gastronômico, o Matilda Lanches tem desde a abertura opções de shake com leite de amêndoa e sandubas veganos.
As transformações não se restringem à mesa — estendem-se à coquetelaria. No bar-restaurante Quincho, na Vila Madalena, os drinques que levariam espuma de clara de ovo, como o moscow mule, são feitos com uma versão vegetal de lecitina de soja. “O público saudável também quer tomar um bom drinque”, afirma a chef Mari Sciotti. Vestuário, calçados, maquiagem e outros produtos de beleza não ficam de fora da mudança cultural. Gigantes do ramo, como a Natura, têm apostado forte na tendência. “Hoje, 80% do nosso portfólio é vegano. Nossa busca por modos de operar mais sustentáveis levou à vegetalização dos produtos e ao fim dos testes em animais a partir de 2006”, lembra a diretora de inovação Roseli Mello. “O consumidor brasileiro está mais atento.”
Depois de conhecer de perto o stress do mundo corporativo, a terapeuta Marcelle Martins decidiu fundar, junto com Thiago Carvalho, um centro que favorecesse o despertar de uma consciência sobre novas formas de trabalhar e alimentar-se. Desde meados de 2018, o aFlora, em Pinheiros, une empresas de impacto positivo ao redor de um centro de meditação. “Queria trazer para a cidade a experiência que as pessoas buscam em um retiro”, afirma Marcelle. O cartão de visitas do espaço é o misto de café e restaurante Purana.co, criado com Alana Rox, autora do best-seller Diário de uma Vegana, Fabiana Raucci e outros sócios. “Não tem nada mais transformador do que a comida. Recebemos quase 800 pessoas aos sábados e conseguimos mostrar que uma receita vegana não é só mato e que, se benfeita, ela pode ser muito gostosa”, diz Alana.
Expoente dessa culinária na Califórnia e espécie de celebridade no meio, o chef Matthew Kenney terá um braço paulistano ainda neste mês, quando deve ser inaugurado o PlantMade, em Higienópolis. O casal Daniele e Fabio Zukerman é o responsável por trazer a marca para cá. “O Matthew elevou o padrão da gastronomia plant based nos Estados Unidos, e acreditamos que São Paulo pedia por algo assim”, diz Daniele. Com tantas opções, está cada vez mais fácil conseguir um lugar à mesa desse banquete feito só de vegetais.
OS MELHORES RESTAURANTES VEGANOS DE SÃO PAULO
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 17 de abril de 2019, edição nº 2630.