Shows evangélicos no Pacaembu preocupam moradores da região
Eles temem a volta dos grandes espetáculos ao campo. Ministério Público promete enquadrar os responsáveis pelo aval
Seis anos após a banda Pearl Jam tocar seus acordes para 40.000 pessoas no último grande show registrado na história do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho, o Pacaembu, seus vizinhos voltaram a conviver com os megaeventos. Só neste ano, usando brechas e enfrentando as determinações judiciais que proíbem o uso do espaço para festas que sejam “prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde” do bairro, o prefeito Gilberto Kassab autorizou duas celebrações evangélicas que reuniram, juntas, cerca de 70.000 pessoas.
Em setembro, ocorreu por ali uma partida entre bispos e pastores da Igreja Universal. Na última terça (15), foi a vez de uma multidão louvar o centenário da Assembleia de Deus no Brasil, celebração que contou com a presença de políticos e autoridades como o próprio Kassab e o governador Geraldo Alckmin. Os dois precedentes deixaram os moradores do entorno ressabiados, crentes de que as liberações podem ser um sinal da volta da concorrida agenda de apresentações extra-futebol. “Nosso receio é que a vida por aqui volte a ser um inferno”, afirma Iênidis Benfati, presidente da associação Viva Pacaembu por São Paulo. O próprio Ministério Público, preocupado com a situação, promete enquadrar os responsáveis pelo aval por improbidade administrativa, além de pedir indenização por danos coletivos e aplicação de multa aos envolvidos nos atos religiosos.
O Estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi, também está no meio de um fogo cruzado. Palco de apresentações recentes que incluíram as do guitarrista Eric Clapton e do ídolo jovem Justin Bieber, a maior arena da cidade se encontra igualmente na mira do MP e das associações de bairro. Segundo Gilberto Leme Garcia, da Promotoria do Meio Ambiente, o São Paulo Futebol Clube, proprietário do estádio, vem seguidamente desrespeitando um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) de 2009 que proíbe a realização de espetáculos após as 22 horas. “Enviamos uma recomendação à prefeitura para não expedir mais licenças para o local”, diz ele, que também estuda processar eventuais desrespeitos.
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Do outro lado da cidade, o futuro campo do Palmeiras só deve ficar pronto em 2013, mas já é visto com desconfiança. “Estamos preocupados com os espetáculos que deverão ser realizados aqui”, afirma Anna Claudia de Salles, presidente do Conselho de Segurança Comunitária de Perdizes. “Se os shows no antigo Palestra Itália já travavam as ruas e causavam balbúrdia, imagine como será com uma estrutura maior ainda.” Por causa dessas polêmicas, os administradores dos estádios buscam formas de conciliar os interesses do showbiz e os dos paulistanos que moram perto deles. Circula nos gabinetes do governo municipal um projeto de reforma do Pacaembu, que ganharia isolamento acústico e um estacionamento.
No Morumbi, o São Paulo espera concluir até julho de 2013 uma cobertura orçada em 100 milhões de reais. O projeto inclui uma espécie de cortina que descerá até o chão, formando uma arena fechada atrás de um dos gols para receber 25.000 pessoas. A WTorre, responsável pela construção do novo campo do Palmeiras, promete limitar ao máximo o impacto de grandes eventos na vizinhança com um moderno sistema antirruído.
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Mas a questão é complicada e há vários interesses em jogo. As dificuldades hoje impostas pela Justiça para a realização de espetáculos nesses espaços causam apreensão no mercado do entretenimento. Presidente da empresa de eventos B!Ferraz, José Boralli acha difícil organizar qualquer negócio por aqui para mais de 3.000 pessoas. “É uma luta”, diz ele, que está por trás do festival de música Planeta Terra. “Optamos pelo Playcenter, que está longe de ser o lugar ideal, mas não havia alternativa.” Responsável pela SPTuris, empresa de turismo e eventos de São Paulo, o executivo Caio Luiz de Carvalho vislumbra uma luz no fim do túnel. Segundo ele, o governo quer construir um amplo centro de exposições em Pirituba, além de criar, até o ano que vem, uma nova arena dentro do Anhembi. “E devemos repensar o Pacaembu e o Morumbi, mas sem descartar o seu uso”, defende. “As pessoas precisam relativizar o incômodo, pois os eventos são os principais ativos da cidade.”