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“A iniciativa do Butantan tirou o Brasil do ‘fim da fila’ da vacina”

Papo Vejinha: Dimas Covas dá detalhes do acordo de criação com chineses, que pode colocar país em lugar privilegiado na imunização contra o coronavírus

Por Pedro Carvalho
Atualizado em 19 jun 2020, 08h00 - Publicado em 19 jun 2020, 06h00
Na coletiva para anunciar a parceria com a Sinovac: doses serão gratuitas
Dimas Covas em coletiva para anunciar a parceria com a Sinovac (Governo do Estado de São Paulo/Divulgação)
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É possível dizer que alguma vacina do coronavírus existirá, independente de qual ou quando?

É uma boa pergunta. Com certeza, vai haver uma vacina. As dez que estão na fase final de estudos clínicos, com certeza, vão chegar à fase 3 (testes na população). Essa epidemia trouxe uma grande lição. Tivemos outras duas epidemias de coronavírus, a Sars e a Mers. Naquele tempo, algumas companhias chegaram a ter protótipos vacinais, que foram abandonados porque a epidemia não cresceu. Se tivéssemos essas vacinas lá atrás, estaríamos muito melhor agora. Seria muito mais fácil desenvolver uma vacina contra o novo coronavírus. Os países desenvolvidos perceberam que investimento em vacina é uma prevenção para o futuro.

Mas, do ponto de vista tecnológico, é possível afirmar, então, que alguma vacina vai chegar lá.

Sem dúvida alguma.

Se outra chegar lá antes, ainda assim a do Butantan, em parceria com a chinesa Sinovac, será feita?

Sim. Acredito que não vamos ter apenas uma, mas algumas vacinas.

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Qual é a chance de essa vacina ser gratuita e distribuída pelo SUS?

Todas as vacinas que o Butantan produz são destinadas ao SUS, somos um instituto público. Essa seria da mesma forma. Mas haverá outras no mercado, mesmo no Brasil. Entre as três (as da Moderna e da AstraZeneca, já em fase 3, e a do Butantan-Sinovac), a nossa é a única que usa uma tecnologia testada em larga escala. Temos conhecimento acumulado de décadas. Então ela é mais previsível. Ter chegado à fase 2 com proteção acima de 90% mostra que a fase 3 terá grandes possibilidades de ser bem-sucedida.

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Visita de João Doria ao Instituto Butantan
Visita de João Doria ao Instituto Butantã (Governo do Estado de São Paulo/Divulgação)

Como será a corrida pelo acesso à vacina, após ela ser lançada?

O Butantan é um dos grandes produtores de vacina do mundo. Nosso programa público de imunização é maior que o da China, dos EUA, da Índia. Capacidade de produção é importante, não adianta só descobrir a vacina. Mas haverá critérios de fila: idosos, pessoas com baixa imunidade…

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Mas é correto afirmar que o Brasil estaria no fim da fila e a iniciativa do Butantan mudou isso?

Não há dúvida. Foi uma grande tacada. O Brasil estava ficando à margem das grandes negociações. Mas ninguém sabia o que vinha rolando por baixo…

E o que estava rolando? Como foi a negociação? Vocês se aproximaram ou os chineses se ofereceram?

Nós é que procuramos ativamente os possíveis parceiros. Começamos a prospectar isso quando surgiu a epidemia. Fizemos vários pré-acordos, contratos de confidencialidade. Em determinado momento, vimos que a melhor vacina seria a chinesa, que usa uma tecnologia que o Butantan domina. Isso foi determinante. Mas estamos sempre em contato com pesquisadores internacionais.

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Os testes já começaram?

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Na segunda (15), fizemos as primeiras reuniões com as agências brasileiras, para apresentar o estudo clínico. Acreditamos que os testes comecem em julho. Depende da Anvisa e de outros órgãos.

Se der certo, quantas doses o Brasil terá direito de produzir?

O acordo é: no Brasil vai ser a “Vacina Butantan”, na China vai ser a “Vacina Sinovac”. A gente produz o que for necessário da nossa vacina. O Butantan vai atender o Brasil em primeiro lugar.

“Do ponto de vista da economia, um lockdown em São Paulo teria sido melhor. Só com o isolamento social o que duraria três meses acaba levando sete, oito”

São Paulo reabriu prematuramente?

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O Plano São Paulo é bom, porque tem um “termômetro”, que vai de vermelho a azul. Toda vez que você entra em uma quarentena, tem de prever a saída. É impossível manter isolamento por um ano. O risco está na maneira como as pessoas interpretam esse termômetro. Em São Paulo, aparentemente, a mensagem do governo de que “a quarentena permanece” não pegou. Muita gente voltou para a rua.

A cidade deveria ter feito lockdown?

Há três formas de lidar com uma epidemia. A primeira é não fazer nada. A epidemia mata milhões e, em dois meses e meio, acaba. A gripe espanhola foi assim. Outra é fazer o lockdown. Para tudo por um mês e meio, mas acaba com a epidemia. Aí retoma devagar. Foi a estratégia da Coreia do Sul, da Europa. A terceira, que aconteceu aqui, é fazer o isolamento social e achatar a curva. Mas aquilo que duraria três meses acaba durando sete ou oito.

Mas qual teria sido melhor?

Do ponto de vista da economia, por causa da recuperação mais rápida, deveria ter sido feito o lockdown. Agora, é diferente fazer isso na China ou na Itália e fazer no Brasil, em regiões onde as pessoas precisam sair de casa para ganhar o pão.

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O senhor tem 63 anos. Tem ido ao trabalho neste período?

Nunca trabalhei tanto. O dia tem hora para começar, mas não para acabar. Paro meia noite e meia… Vou todo dia ao Butantan.

Chegou a ser contaminado?

Não. Devo ter feito uns quinze testes, faço toda semana. Ainda não tive. Estou sempre de máscara e tomo as medidas de afastamento. Isso mostra que, quando você se protege, não pega.

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 24 de junho de 2020, edição nº 2692.

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